Nesta quinta-feira, dia 27, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou, por 2 votos de diferença, a redução da maioridade penal. A Senadora Patrícia Saboya apresentou voto em separado, contra a proposta aprovada. Confira a notícia e a argumentação da senadora
CCJ aprova redução da maioridade penal
A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou nesta quinta-feira a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos. A votação foi apertada por 12 votos a 10. A Proposta de Emenda à Constituição ainda precisa passar pela votação em dois turnos no Plenário do Senado e depois segue para a Câmara.
A Proposta de Emenda à Constituição foi discutida nesta quinta-feira na comissão após muitos adiamentos. Antes da aprovação, a senadora Patrícia Saboya (PSB-CE) apresentou voto em separado contrário à redução. Patrícia alegou que a redução seria um retrocesso "inconcebível para o País". Segundo ela, apenas 1% dos homicídios são cometidos por adolescentes.
"Dados derrubam o mito de que adolescentes são perigosos. Redução da maioridade não diminuiria o problema da impunidade, que beneficia os adultos e não os adolescentes", disse.
O senador Demóstenes Torres (DEM-GO), relator da PEC e maior defensor da maioridade, procurou abrandar sua proposta. Para tentar convencer os colegas, ele apresentou emenda de que o adolescente maiores de 16 e menores de 18 anos sejam presos separadamente dos maiores.
Torres propôs ainda um exame psicológico para o adolescente criminoso. Caso ele receba um "laudo de que não tem capacidade de entender o caráter ilícito do fato, ele responderá como um menor." Ele disse ainda que a justiça juvenil tem se mostrado ágil, ao contrário da lei "normal".
*Votações*
Hoje a comissão já aprovou em turno suplementar, com 20 votos favoráveis, substitutivo do senador Demóstenes Torres a projeto do senador Aloizio Mercadante (PT-SP) que separa os presos por periculosidade. De acordo com o texto aprovado, presos por cometerem crimes mais graves não ficarão nas mesmas instalações prisionais que os condenados por crimes mais leves.
A CCJ adiou ainda a votação do relatório do senador Demóstenes a duas propostas de emenda à Constituição (PECs) que tornam obrigatória a aplicação de recursos na área de segurança pública. O adiamento deve-se a pedido do relator para examinar emenda do senador Aloizio Mercadante (PT-SP) à matéria. As propostas são de autoria dos senadores Renan Calheiros (PMDB-AL) e Romeu Tuma (Democratas-SP).
Voto em separado apresentado pela Senadora Patrícia Saboya
Minuta
RELATóRIO Nº , DE 2007
Da Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, sobre a proposta de redução da maioridade penal, para apresentação na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.
Relatora: Senadora PATRíCIA SABOYA GOMES
Preocupada com as repercussões da proposta de redução da idade penal, que lança injustamente sobre os ombros dos adolescentes a culpa pelo aumento da violência e da criminalidade no País, a FRENTE PARLAMENTAR EM DEFESA DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE, integrada por 25 senadores e 134 deputados, deposita nas mãos do Presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, Senador Antônio Carlos Magalhães, para que divulgue nesse Colegiado, como resultado das contribuições recebidas da sociedade civil e da audiência pública realizada no último dia 10 de abril nesta Casa, o presente manifesto contrário à redução da maioridade penal, pelas razões de forma e de mérito expostas a seguir.
1) A redução da idade penal mostra-se inviável nos termos da Constituição da República Federativa do Brasil em vigor, pois a não-aplicação do direito penal aos menores de 18 anos e a sujeição destes a legislação especial são garantias individuais, insuscetíveis de mudança, conforme determina o art. 5º, § 2º, combinado com o art. 60, § 4º, inciso IV, da Lei Maior.
2) Além de violar cláusula pétrea constitucional, a proposta afronta parâmetros internacionais de proteção dos direitos humanos que o Estado Brasileiro se comprometeu a cumprir, como a Convenção sobre os Direitos da Criança, as Regras Mínimas Para a Administração da Justiça de Menores (Regras de Beijing), as Diretrizes para a Prevenção da Delinqüência Juvenil, as Regras Mínimas Para a Proteção dos Menores Privados de Liberdade (Regras de Riad) e o Pacto de San Jose da Costa Rica, documentos que demandam proteção e cuidados especiais para os infratores com menos de 18 anos.
3) A adoção dessa proposta, se fosse possível sob o ordenamento constitucional em vigor, implicaria a denúncia dos instrumentos internacionais referidos, prejudicando a imagem do Brasil no exterior e provocando imenso desgaste político, não só por conflitar com a nossa tradicional postura de vanguarda no tocante à edição de leis voltadas à proteção dos direitos humanos, mas especialmente por significar um retrocesso inconcebível para o país que se notabilizou justamente por ser o primeiro do mundo a aprovar uma lei relativa à infância e à juventude em total conformidade com a Convenção sobre os Direitos da Criança.
4) O rebaixamento da idade penal teria pouco ou nenhum impacto sobre os índices de criminalidade, porque mais de 90% dos crimes são praticados por adultos. Basta dizer que no Estado de São Paulo, onde se registra o maior número de delitos, os adolescentes foram responsáveis por menos de 4% dos crimes cometidos em 2003. Tal realidade se reflete no número de pessoas privadas de liberdade no País: atualmente, existem cerca de 15.600 adolescentes infratores internados contra mais de 385 mil adultos presidiários, sem contar os outros 350 mil condenados ainda soltos. Trata-se de uma parcela ínfima dos 21 milhões de brasileiros com idade entre 12 e 18 anos, 14 milhões dos quais carentes de tudo, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU). O percentual de delitos atribuídos aos adolescentes brasileiros, aliás, está abaixo da média mundial, que é 11,6%, e fica muito aquém do número registrado no Japão (42,6%). Esses dados derrubam o mito de que a criminalidade avança por conta da conduta dos adolescentes.
5) Se visível, o efeito da redução da idade penal sobre a criminalidade apareceria apenas no âmbito dos crimes contra o patrimônio, que somam mais de 70% dos casos de infração juvenil. O porte de arma, o tráfico de drogas e a condução de veículo sem habilitação praticamente completam o rol de infrações dos adolescentes, em que são raros os homicídios (cerca de 1%), embora os mais cruéis ganhem notoriedade devido à divulgação que recebem da imprensa. Esses dados derrubam o famoso mito de que os adolescentes são especialmente perigosos.
6) Não houve, nas últimas décadas, um incremento específico da criminalidade juvenil que pudesse embasar o rebaixamento da idade penal, mas sim o aumento generalizado da criminalidade acompanhando o êxodo rural e o crescimento desordenado dos centros urbanos. Note-se que, há mais de um século, a participação dos adolescentes no total dos crimes perpetrados no Brasil continua inferior a 10%.
7) A redução da idade penal não diminuiria o problema da impunidade, que beneficia os adultos, não os adolescentes. De fato, a justiça penal é lenta e condescendente: dos 600 mil crimes registrados entre 1998 e 2003 em São Paulo, menos de 3% foram esclarecidos e poucos de seus autores foram condenados; no que tange aos casos de homicídio contra crianças e adolescentes, apenas 1,72% resultaram em condenação dos réus, e a maioria destes não foi para a prisão. A justiça juvenil, ao contrário, tem se mostrado ágil e rigorosa: leva, no máximo, três meses para estabelecer as punições cabíveis aos infratores e determina a privação da liberdade para boa parte deles, como fez com os 38,5% que hoje estão submetidos à internação, a mais severa das medidas socioeducativas. Esses dados mostram que é falsa a idéia de que o adolescente não é punido.
8) O rebaixamento da maioridade penal não inauguraria a prática de responsabilização do adolescente, pois este já responde por seus atos delitivos a partir dos 12 anos de idade, em conformidade com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Essa lei prevê seis medidas coercitivas, de caráter predominantemente pedagógico, aplicáveis aos infratores em função da gravidade do delito cometido ou de sua reiteração, a saber: advertência, reparação de danos, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, semiliberdade e internação, que é a privação da liberdade. O emprego de medidas similares àquelas estabelecidas pelo direito penal faz ruir mais um mito: o de que o adolescente não responde por seus crimes.
9) Não são excessivamente brandas as medidas previstas no ECA para a responsabilização do adolescente infrator. Dependendo da gravidade de sua conduta, o adolescente pode ficar sem liberdade por até três anos. Isso significa 1/4 da existência daquele com 12 anos e 1/6 daquele de 18, nada pouco para quem está fixando limites e valores. Em termos proporcionais, esse quantum representa penas de nove e seis anos de reclusão, respectivamente, para um adulto com 36 anos de idade. Cuida-se de um prazo bastante razoável e rigoroso: primeiro, quando se tem em mente que o adulto pode deixar a prisão depois de cumprir 1/6 da pena, não mais do que 5 anos para quem é condenado ao máximo de 30 anos de reclusão, benefício que não alcança o adolescente; segundo, quando se leva em conta a necessidade de obedecer aos princípios constitucionais da brevidade e do respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, no momento da aplicação de medida privativa da liberdade ao adolescente.
"CCJ aprova redução da maioridade penal" originalmente publicada em www.terra.com.br
"Voto em separado apresentado por senadora Patrícia Saboya" originalmente publicada em www.direitos.org.br