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Redes de Juventude na América Latina

O boletim Rede Jovem de Cidadania dessa semana é uma edição especial sobre associativismo juvenil na América Latina e dá destaque ao Fórum Latino-Americano de Juventude, que promoveu uma oficina sobre liderança e gestão política durante a 4ª edição da Universidade de Participação Cidadã, realizada no Uruguai entre os dias 18 e 21 de maio deste ano. Quem traz informações sobre essa articulação é Áurea Carolina, jovem que participou do evento como interlocutora do Fórum Nacional de Movimentos e Organizações Juvenis

Os esforços voltados para a efetivação de direitos fundamentais da juventude na América Latina nas últimas décadas estão fortemente atrelados à concepção de que os/as jovens devem ser tomados/as como agentes estratégicos/as e protagônicos/as do desenvolvimento da região. Isso se deve tanto ao peso numérico desse segmento populacional (os/as jovens na faixa etária de 15 a 24 anos representam, atualmente, cerca de um quarto da população latino-americana) quanto à sua situação específica de vulnerabilidade, tendo em vista que os/as jovens estão mais expostos à pobreza e a outras persistentes e graves desigualdades que caracterizam o padrão sócio-econômico de toda a região, não obstante as peculiaridades que diferenciam cada um dos países.

O estabelecimento do Ano Internacional da Juventude pela Organização das Nações Unidas, em 1985, impulsionou uma série de iniciativas inéditas ou ainda incipientes nesse sentido, sobretudo a realização de seminários e pesquisas sobre as condições de vida dos/as jovens latino-americanos e o delineamento primário de políticas públicas que pudessem responder às realidades diagnosticadas. Legitimado por uma demanda supranacional, aquele ano tornou-se um marco importante para o surgimento de redes não-governamentais em vários países e também para a gradual incorporação da questão juvenil nas agendas estatais. Não se pode deixar de lembrar que isso se passou numa conjuntura histórica pouco favorável, quando muitos países latino-americanos acabavam de sair de regimes ditatoriais, e marcada pela desestruturação da sociedade civil no continente.

Fórum Latino-Americano de Juventude

Nesse contexto, destaca-se a criação, em 1994, do Fórum Latino-Americano de Juventude (FLAJ), como resultado de um amplo processo de articulação iniciado ainda na década de 1980 e que envolveu a participação de diversas entidades vinculadas a jovens, outras formadas por jovens e organismos de cooperação internacional, em especial a UNESCO e o Conselho de Juventude da Espanha (CJE) http://www.cje.org. O FLAJ é uma instância não-governamental que busca se consolidar como espaço plural e de convergência de múltiplas expressões organizadas de juventude da América Latina, tendo como principal finalidade o desenvolvimento do tecido associativo e a participação dos/as jovens na construção de políticas públicas em seus respectivos países.

Atualmente, o FLAJ agrega 21 organizações juvenis internacionais, ONGs especializadas na área e plataformas nacionais de juventude, que se assemelham aos fóruns constituídos pela sociedade civil no Brasil. A única representação brasileira no FLAJ é do Movimento Infanto-Juvenil de Reivindicação (Mirim-Brasil http://www.mirimbrasil.org.br/), que integra o Movimento Internacional dos Falcões – Internacional Socialista para a Educação.

Universidade de Participação Cidadã

Outra importante iniciativa que veio incrementar, mais recentemente, o campo da mobilização juvenil na América Latina é a Universidade de Participação Cidadã (UPC), que é realizada no Uruguai desde 2004 pela ONG Foro Juvenil http://www.forojuvenil.org.uy/ e pela Asociación Cristiana de Jóvenes do Uruguai – ACJ http://www.acj-ymca.org/. A UPC é um instrumento de formação, cooperação e intercâmbio entre organizações juvenis e visa fortalecê-las por meio do diálogo intergeracional e do empoderamento dos/as jovens, baseada numa perspectiva humanista, integral, sustentável, socialmente eqüitativa e com respeito às diferenças.
A proposta da UPC é inspirada na experiência da Universidade de Juventude e Desenvolvimento, evento que acontece anualmente na cidade de Mollina, na Espanha, e reúne jovens ligados/as a organizações juvenis de todo o mundo para vivenciar formações e compartilhar conhecimentos em torno do tema “juventude e desenvolvimento global”.

A 4ª edição da UPC aconteceu de 18 a 21 de maio de 2007, nas instalações do Acampamento Artigas http://www.acj-ymca.org/campa.htm, que pertence à ACJ, e se orientou pelo eixo temático “educação, participação e liderança juvenil”. Durante os quatro dias, a maior parte da programação foi preenchida por atividades simultâneas distintas, como a oficina “Liderança e Gestão Política”, promovida conjuntamente pelo FLAJ e pelo CJE, e o encontro dos/as jovens participantes do projeto “Pintó Cuidarse” http://www.inlatina.org/pinto/, voltado para promoção da saúde e educação sexual de jovens no Uruguai.

Além das atividades específicas, houve momentos de interação entre todos/as os/as participantes em atividades unificadas, como a oficina “Aprendizagens em Educação Global”, coordenada por Nuno da Silva, da ONG internacional Youth for Exchange and Understanding http://www.yeu-international.org/, que provocou a aproximação de adolescentes e jovens mais velhos/as em jogos colaborativos. Também foram realizadas diversas atividades culturais ao longo da programação da UPC, como danças, brincadeiras e cantigas de roda.

Liderança e Gestão Política

Na oficina de Liderança e Gestão Política, especificamente, foram trabalhados conteúdos teóricos e relatos sobre participação social junto a 26 jovens da América Latina e da Espanha que tinham em comum a inserção em movimentos, organizações formais e/ou plataformas/redes de juventude em seus países de origem.

A formação buscou expandir as capacidades e habilidades dos/as participantes no que se refere à gestão associativa, abordando assuntos como eficácia no uso de recursos, interlocução junto a diversas instâncias e incidência das lutas e reivindicações políticas na sociedade. Um dos propósitos foi facilitar a visualização de desafios atuais no estabelecimento de prioridades temáticas e estratégicas para as mobilizações juvenis na América Latina.

Os enfoques teóricos, com o aporte conceitual sobre os temas enfatizados, e os vivenciais, com as contribuições trazidas pelos/as participantes, se complementaram na elaboração de sínteses que apontaram dificuldades muito semelhantes que suplantam as particularidades dos países e assumem um caráter estrutural para toda a região. Entre os itens avaliados, são enumeradas como debilidades comuns a instabilidade de coordenação e de comunicação interna e externa nas redes/plataformas juvenis, a falta de recursos financeiros, a descontinuidade dos processos de mobilização, a falta de uma estratégia de preparação permanente de lideranças e as distâncias geracionais dentro das próprias organizações.

Apesar do quadro desfavorável, foi debatido que algumas oportunidades podem se desenhar a partir de alianças estratégicas junto a agências de cooperação internacional e da consolidação de instrumentos próprios das redes/plataformas para capacitar suas lideranças, sistematizar suas experiências e aprimorar suas capacidades técnicas e políticas. Os/as jovens também avaliaram positivamente o empenho das sociedades civis nacionais de toda a região em prosseguir fomentando redes juvenis. O compromisso, a diversidade de temas e organizações, a legitimidade de base, o potencial de liderança e o grande alcance territorial foram percebidos como fortalezas animadoras que têm alimentado as redes.

No Brasil

A realidade brasileira faz parte deste contexto genérico da América Latina e obviamente apresenta traços mais específicos que devem ser analisados. Ao passo que em diversos países da região, como na Nicarágua, no Panamá ou em El Salvador http://redjuves.tripod.com/, onde existem plataformas juvenis minimamente consolidadas há quase dez anos ou mais, no Brasil a construção de uma plataforma nacional de juventude é mais recente e instável. O Fórum Nacional de Movimentos e Organizações Juvenis http://www.aic.org.br/rede/agencia/boletim_30.htm (FNMOJ), principal referência de articulação juvenil no país, tem enfrentado dificuldades para se manter e viabilizar os seus objetivos. Criado em 2004, o FNMOJ se propõe a reunir as diversas juventudes brasileiras num espaço plural e autônomo e fomentar suas lutas e bandeiras. Apesar de ser uma rede vasta e representativa, pois já contou com a participação de dezenas de entidades nos encontros e oficinas que realizou, sua força política é tímida e deve ser aprimorada e ampliada.

Em novembro de 2006, na oportunidade do Seminário do Conselho Nacional de Juventude, o FNMOJ realizou uma reunião paralela em que se discutiu a necessidade de promover um encontro para planejar sua própria atuação e firmar uma agenda de reivindicações ainda em 2007. Formou-se uma comissão de trabalho para elaborar o projeto do encontro, captar recursos e construir o site do Fórum. Para a concretização de tais encaminhamentos, a comissão tem enfrentado problemas de comunicação e financiamento.

A superação de tais desafios deverá englobar, entre outras ações estratégicas, a interlocução entre o FNMOJ e diferentes instituições que apóiam o associativismo juvenil no Brasil, na América Latina e no cenário internacional, de forma a fortalecer a rede brasileira, possibilitar a continuidade de seus trabalhos e conectá-la a outras articulações existentes. Por fim, a aproximação entre o FNMOJ e as redes juvenis da América Latina pode ser produtiva e enriquecedora para o intercâmbio e a integração desse continente que precisa encarar com mais vigor as injustiças e violências que sistematicamente atingem as juventudes que nele vivem.

* Esse texto foi escrito por Áurea Carolina, colaboradora da Associação Imagem Comunitária, tem 23 anos, é rapper e Secretária Executiva do Conselho Municipal de Juventude de Belo Horizonte. Participou da UPC 2007 como interlocutora do Fórum Nacional de Movimentos e Organizações Juvenis.

Contatos:
Áurea Carolina: (31) 96...
E-mail: aureacarolina@yahoo.com.br

Originalmente publicado em Boletim Rede Jovem de Cidadania, Belo Horizonte, 25 de junho de 2007 - Ano 04 #11