A Polícia Civil do Rio afirma que um tenente teria arquitetado a entrega dos três rapazes do morro da Providência aos traficantes do morro da Mineira, no sábado (14). O oficial está entre os 11 militares presos apontados como os responsáveis pelo crime
O delegado da 4ª Delegacia de Polícia do Rio (Central), Ricardo Dominguez, que investiga o caso, afirmou que o tenente e outros dois militares ouvidos nesta segunda-feira confessaram ter entregado os jovens -David Wilson Florêncio da Silva, 24, Wellington Gonzaga Costa, 19, e Marcos Paulo da Silva, 17- aos traficantes da Mineira. Os três jovens foram encontrados mortos no últim domingo, dia 15, no lixão de Gramacho, em Duque de Caxias (Baixada Fluminense).
Para o delegado, o tenente não gostou da decisão de seu superior de liberar os jovens, após eles serem detidos no alto do morro da Providência e levados a um quartel do Exército no sábado. Depois disso, planejou, durante uma reunião com outros militares, a entrega dos jovens aos traficantes da favela rival.
"O oficial superior não quis registrar a queixa e punir os jovens, mas o tenente não acatou e decidiu, por conta própria, cometer o crime e deixar os jovens na mão dos traficantes no morro da Mineiro", afirmou Dominguez.
O delegado disse ainda que o tenente não se mostrou arrependido com o crime durante o depoimento. "Ele não mostrou arrependimento, essa é a verdade", disse o delegado.
Os outros oito militares presos deverão prestar depoimentos à polícia nesta terça-feira (17), segundo o delegado. O nome dos 11 militares presos não foi divulgado pela polícia.
Protesto
Após participar do enterro dos três rapazes do morro, os moradores realizaram um protesto em frente ao prédio do Comando Militar do Leste, centro do Rio. Soldados do Exército e manifestantes entraram em confronto.
Durante o protesto, os soldados arremessaram bombas de efeito moral contra cerca de 400 manifestantes. Ao menos um homem foi preso.
Um cordão com 200 soldados foi feito na entrada do prédio do comando. Quando os moradores se aproximaram, os soldados atiraram as bombas, segundo a Polícia Militar.
Vias próximas ao prédio foram parcialmente interditadas com a confusão. A avenida Marechal Floriano ficou bloqueada para a passagem de veículos. Não há registros de feridos com gravidade durante o protesto.
"Marginais"
Nesta segunda, o governador do Rio, Sérgio Cabral (PMDB), chamou de "marginais" os militares suspeitos de participação nas mortes.
"A Polícia Civil atuou com firmeza no caso desses 11 'marginais' que não honraram a farda do Exército Brasileiro. Eles estão apenas travestidos com a farda, portanto devem ser tratados como criminosos", afirmou Cabral em Berlim, na Alemanha, onde está em missão oficial em busca de novos negócios para o Estado do Rio.
Exército
Em nota, o CML (Comando Militar do Leste) disse nesta segunda-feira que repudia o ato de que 11 militares são suspeitos. "O Exército repudia, veementemente, qualquer desvio de conduta e qualquer ação fora da legalidade praticada por seus integrantes", diz a nota.
No fim de semana, o CML informou que foi instaurado um inquérito policial militar para apurar o desaparecimento e morte dos três jovens.
Também nesta segunda, o Exército negou que tenha feito uso de violência e que tenha implantado toque de recolher no morro da Providência, conforme relataram moradores. Segundo a denúncia, os militares que ocupam a favela desde dezembro do ano passado agem com violência e truculência contra a população local.
O Exército também afirmou que continuará a ocupação na favela até, ao menos, dezembro deste ano, prazo inicial para o fim das obras no local.
Mortes
Os jovens haviam desaparecido no sábado, após serem abordados por militares em uma praça do morro da Providência e levados para um quartel do Exército. Os jovens foram encontrados mortos ontem no lixão de Gramacho, em Duque de Caxias (na Baixada Fluminense).
Segundo a polícia, os rapazes foram entregues por militares para traficantes do morro da Mineira. As investigações preliminares apontaram que os jovens sofreram agressões e foram assassinados pelos traficantes antes de serem despejados no aterro.
A Justiça determinou a prisão, por dez dias, dos 11 militares suspeitos --um oficial, quatro sargentos e seis soldados. Eles foram presos na manhã desta segunda e levados para o 1º Batalhão da Polícia do Exército, na Tijuca (zona norte).