O Jongo é cultura do sudeste criada durante o período colonial com a chegada de negros e negras da nação Banto ao Brasil. A magia entoada pelo soar dos tambores, os pontos de louvação e de brincadeiras puxados por cantadores, a beleza dos passos da dança com saias rodadas, lembram as rodas de samba do recôncavo baiano. O Jongo tem origem nas expressões culturais africanas e se propagou nos estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Hoje, comunidades jongueiras e pesquisadores trabalham para a continuidade desta cultura em constante transformação só encontrada no sudeste brasileiro
O reconhecimento pelo IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) do Jongo como Patrimônio Imaterial em 2005, permitiu o surgimento de diversos projetos voltados para a salvaguarda do jongo e das comunidades jongueiras. O Pontão de Cultura do Jongo/Caxambu surgiu como uma destas iniciativas. Resultado de diferentes experiências em diversos setores da UFF (Departamento de Educação Matemática em Santo Antônio de Pádua, Observatório Jovem do Rio de Janeiro e Laboratório de História Oral e Imagem – LABHOI) e com a parceria das comunidades jongueiras. O Pontão do Jongo/Caxambu começou a atuar efetivamente em março de 2008 após o processo de convênio com o CNFCP/IPHAN (Conselho Nacional de Folclore e Cultura Popular/Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) e a Fundação Euclides Cunha (FEC/UFF).
A coordenação geral do projeto é da Profª. Drª Eliane Monteiro do Departamento de Educação Matemática/UFF de Santo Antonio de Pádua. Contando com a participação junto a lideranças jongueiras do sudeste, professoras e alunas da Universidade Federal Fluminense (UFF) que contribuem para a realização de oficinas, documentários e seminários. Segundo a doutoranda em Educação da UFF e colaboradora do Pontão Mônica Sacramento, o Pontão de Cultura do Jongo/Caxambu prevê três eixos de ação: articulação, capacitação e difusão da cultura jongueira.
As comunidades que integram o Pontão são treze: Santo Antonio de Pádua, Miracema, Porciúncula, todas do Noroeste Fluminense; Guaratinguetá, Piquete e São José dos Campos, em São Paulo; Barra do Piraí, Pinheiral, Valença e Angra dos Reis, no Sul Fluminense e Serrinha, na capital do Rio de Janeiro; e as comunidade de São Matheus – ES e Carangola – MG.
Na etapa de articulação a preocupação do projeto foi com a infra-estrutura das comunidades e a possibilidade de encontro das mesmas. Neste primeiro ano, o Pontão realizou eventos que estimularam a participação das comunidades e o fortalecimento de outras manifestações culturais de matriz africana. As comunidades participantes do Pontão encontraram apoio para a elaboração de projetos de captação de recursos e participação em editais públicos de apoio a projetos culturais.
As oficinas que compõem o eixo de capacitação foram previamente discutidas com as lideranças jongueiras. Elas apresentaram propostas que estimularam a organização comunitária, a documentação de suas práticas por técnicas de audiovisual, história oral, educação patrimonial e o debate sobre as relações raciais no Brasil. Além disso, houve preocupação com a capacitação de jovens lideranças das comunidades para que estas cuidem da memória do Jongo e articulem ações de melhorias das condições de vida das comunidades jongueiras.
O Pontão de Cultura do Jongo/Caxambu cria uma ponte entre a população jongueira e as escolas ao capacitar jovens das comunidades para difusão cultural. Na tentativa de consolidar a relação de aproximação entre as culturas do Jongo e da escola, encontra-se em elaboração uma caixa de DVDs com documentários sobre o Jongo acompanhada de material de apoio para professores. A perspectiva é que os alunos reconheçam o Jongo como verdadeira cultura e não mero folclore ou uma manifestação popular “exótica”.
Para a pesquisadora Mônica Sacramento, lembrar o Jongo apenas em datas comemorativas não é suficiente para desconstruir estereótipos. “Uma clara abordagem folclórica do Jongo não contribui em nada para a problematização das condições de vida às quais os jongueiros, em grande maioria negros e negras, são submetidos na sociedade brasileira”, salientou .
O Pontão realizou quinze oficinas no ano de 2008, em quase todas as comunidades jongueiras, envolvendo cerca de 350 pessoas. As alunas do Mestrado em Educação da UFF, Mariana Camacho e Julia Zanetti, ministraram as oficinas “jovens lideranças jongueiras”, sob a supervisão do Professor e coordenador do Observatório Jovem Paulo Carrano, nas três grandes regiões de atuação do projeto: São Paulo, Noroeste e Sul fluminense.
Na avaliação de Mariana Camacho as oficinas complementam as reuniões de articulação por colocar em prática aquilo que é idealizado em teoria. “As oficinas de jovens lideranças trabalham o pertencimento do jovem dentro da comunidade procurando discutir caminhos para o relacionamento entre os jovens e os líderes mais antigos das comunidades, isto associado ao debate das políticas públicas para a juventude das comunidades jongueiras”, ressaltou a mestranda.
Para Raquel Dias da Conceição, 32, integrante do grupo de Jongo de Caxambu em Carangola (MG), a oficina de jovens lideranças jongueiras foi a que mais motivou o grupo que possui, atualmente, cerca de 50 membros. De acordo com Raquel, que também é estudante de Serviço Social, o número de participantes jovens cresceu. Os jovens se mostram atraídos em divulgar sua identidade cultural. Foi a partir deste espírito que surgiu a idéia, durante uma oficina do Pontão em Carangola, de criar um jornal que abordasse temas relevantes não só para a comunidade jongueira, mas para a população de maneira geral.
Segundo Raquel, o conteúdo do jornal foi dividido em seções sobre saúde/prevenção, curiosidades, entrevistas com membros da comunidade jongueira, moradores dos bairros e jovens de destaque na comunidade (em diversas áreas: saúde, música, esporte); o jornal dará destaque também à cultura afro-brasileira, aos avanços e mudanças na educação, além de eventos realizados pela comunidade jongueira. “A divulgação não será limitada, pensamos em distribuir inicialmente nas escolas do nosso bairro, onde mora a maioria dos jovens do grupo, deixaríamos alguns exemplares no Centro de Referência e Assistência Social (CRAS), Programa de Saúde da Família (PSF), e em outros lugares com salas de leituras, incluindo a biblioteca municipal, principalmente para os integrantes do grupo”, acrescentou.
Porém, a publicação tem o seu futuro incerto. A falta de parceiros que apóiem os projetos desenvolvidos nas oficinas do Pontão, aparece como um obstáculo para que as idéias sejam postas em prática, e isso pode ser frustrante para os jovens da comunidade que criam expectativas sobre as mudanças que podem ocorrer com o trabalho. “Não colocar em prática esse projeto elaborado naquele momento de sugestão e reflexão das ações e atitudes enquanto jovem jongueiro, é uma forma de desestimular principalmente os adolescentes que precisam desse incentivo”, disse em entrevista ao Observatório Jovem a jongueira Raquel.
Durante todo o ano de 2008 foram colhidos depoimentos de jongueiros para a produção do documentário do Pontão do Jongo/Caxambu. Sob a direção dos professores Paulo Carrano (UFF) e Valter Filé (UFRRJ), o documentário terá como eixo principal histórias de jongueiros e jongueiras das comunidades participantes do Pontão. A proposta não é a realização de um documentário institucional que apresente os objetivos, metodologia, atuação e resultados do Pontão. A questão central que organizou as entrevistas e orienta a edição do documentário é o que significa para cada um dos entrevistados “estar no jongo hoje”. “Algo que nos acompanha neste trabalho diz respeito às relações entre as tradições e as transformações pelas quais passa a cultura do Jongo”, comentou Carrano.
Para o Observatório Jovem o Pontão do Jongo/Caxambu é uma oportunidade de vivenciar o trabalho de formação e produção de conhecimento com jovens inseridos numa cultura de trocas entre sujeitos de diferentes idades. O Jongo e o Caxambu surgem no Brasil como cultura de “pretos e homens velhos”. Ao longo dos anos se transformou culturalmente e incorporou crianças, mulheres e jovens em sua dança de roda, no batuque de seus tambores e na entoação de seus pontos. É significativo para o Observatório participar de política pública que favoreça rede de apoio político e cultural para a articulação entre as comunidades, a formação de lideranças comunitárias e o favorecimento de meios para a preservação da memória jongueira.
Participam do Pontão os seguintes pesquisadores do Observatório Jovem: Os professores Elaine Monteiro e Paulo Carrano, a doutoranda Mônica Sacramento e as mestrandas Julia Zanetti e Mariana Camacho.
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