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O jovem tem direitos como qualquer cidadão

Em entrevista ao Jornal Sou da paz, Helena Abramo discute sobre a importância dos direitos do jovem

Jornal Sou da Paz  - ano  2 - nº 4- 20/12/2002 por Adriana Manfredini

Como surgiu seu interesse em pesquisar a cultura jovem e, em especial, os punks?
Até os anos 70, o movimento estudantil aparentava representar a toda a juventude. Mas quando entrei em contato com o movimento punk no final dessa década e início dos anos 80, percebi que não era dessa forma. Havia uma grande parcela dos jovens que não se identificava como o movimento estudantil, movimento este composto principalmente pela juventude da classe média, que tinha acesso às escolas e às universidades. Os jovens da periferia ficavam de fora. Pesquisando o universo punk em São Paulo, observei que não dava para tratar a juventude de forma homogênea, como se fazia até então. Existiam tribos com posturas, identidades culturais, necessidades e questionamentos diferentes. Assim como os jovens do movimento estudantil, os integrantes dessas tribos, como os punks e darks, queriam construir sua identidade, ter voz ativa, ouvir seu tipo de música, discutir sua visão de mundo. A juventude nunca foi e nem será homogênea.

O que mudou de 1980 para cá culturalmente falando?
A diversidade está mais visível, o que contribuiu para diminuir um pouco os preconceitos. Nos anos 80, os punks precisavam brigar para conseguirem um espaço para tocar. Em 2002, os grupos de hip hop organizaram com sucesso em São Paulo a 2a semana de hip hop, com shows e discussões. É um avanço. Já o que não mudou nesses vinte anos foi a importância que a cultura tem como espaço de construção de identidade para o jovem, e não a violência. Por isso, é vital o governo estimular projetos culturais voltados para os diferentes grupos e tribos juvenis, e não só para os que estão em evidência nos meios de comunicação, como os grupos de rap ou os skatistas.

Por que existem mais ações do governo voltadas para a criança que para o jovem?
A idéia de considerar os jovens como uma população diferente dos adultos - com necessidades e direitos próprios - ainda é recente, diferentemente do que ocorre com as crianças e adolescentes, que têm direitos reconhecidos e organizados em um estatuto.

A situação está se modificando?
Aos poucos, os governantes percebem a importância de implantar programas voltados para a juventude, tanto na área cultural, como na saúde, no trabalho e, principalmente, na segurança. Infelizmente, os jovens foram “descobertos” pelas autoridades de uma forma negativa, quando estas perceberam que problemas como a violência e o narcotráfico estavam ligados diretamente à juventude. Muitas ações do governo ainda são para resolver as questões em que o jovem é o problema, mas também sua vítima, como o caso dos homicídios. Quem mais mata e morre é o jovem.

A sociedade civil já consegue reconhecer a necessidade de discutir os problemas enfrentados pela juventude, como a violência e a dificuldade em conseguir o primeiro emprego?
A juventude é a fase da vida em que o indivíduo procura se inserir na sociedade, iniciar sua carreira profissional e montar sua vida afetiva e sexual. É uma fase em que ele sai para a vida, se expõe em público e deixa o ambiente familiar. As autoridades e a sociedade civil estão mais atentas a essas peculiaridades, tanto que até uma fundação empresarial, como o Instituto Airton Senna, elaborou um conjunto de propostas de políticas públicas voltadas ao público juvenil. Mas é importante que essas novas políticas sejam implementadas não por causa da violência e sim porque os jovens têm direitos como cidadãos.

Qual é o papel da Comissão Extraordinária Permanente da Juventude da Câmara Municipal de São Paulo, da qual a senhora é assessora?
É a primeira vez que a Câmara dos Vereadores tem um espaço próprio para debater as questões da juventude em São Paulo. Desde 2001, quando os trabalhos começaram, a comissão busca avaliar o que existe de políticas públicas voltadas ao jovem – como o bolsa-trabalho – debater as propostas de ongs e entidades da sociedade civil, ouvir o que os jovens querem e dar subsídios aos vereadores para que possam elaborar e votar projetos de forma mais coerente e consciente. E, de certa maneira também, cobrar dos governos a execução desses projetos. Os resultados das reuniões de trabalho são divulgados em um relatório anual.

Qualquer jovem pode participar das reuniões da comissão?
A participação é aberta a todos. Além dos vereadores e dos assessores que compõe a comissão, convidamos especialistas e representantes de grupos juvenis, escolhidos de acordo com o tema a ser discutido na reunião, como cultura, educação, violência, trabalho. Mas qualquer interessado pode acompanhar os debates e, se quiser, dar um depoimento ou fazer uma pergunta. Também vamos atrás do jovem onde ele está para saber o que pensa e quer. Por isso, já foram realizadas várias reuniões fora da Câmara, como em Capão Redondo, Grajaú e Vila Progresso, com a presença da juventude local.

O jovem está de fato interessado em discutir os próprios problemas?
Um rapaz que participou de uma das reuniões da comissão levantou essa questão. Segundo ele, muita gente acredita que a juventude não tem interesse político, que não gosta de participar da política e que, quando é chamada para debater as questões de próprio interesse, ignora o convite. Para esse rapaz, o problema é que não existe de fato a vontade de ouvir os jovens. Nossa experiência na comissão mostra que quando há alguma abertura para dar a palavra para a juventude, esta aproveita a oportunidade. Os jovens têm muito a dizer e a influenciar as políticas públicas voltadas a eles próprios. Isolados, têm mais dificuldade em se expressar. Mas reunidos em grupos de interesses semelhantes, sejam musicais, esportivos ou sociais, concentram força e conseguem ampliar sua voz, como fizeram os punks, os adeptos do hip hop e tantos outros.

Serviço:
Comissão Extraordinária Permanente da Juventude – Viaduto Jacareí, 100 – tel. 3111-2068 – e-mail: juventude@camara.sp.gov.br