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O Bolsa Família e a política de juventude

Recentes críticas à ampliação da faixa etária dos filhos de beneficiários do programa Bolsa Família me remetem a esta reflexão

NA POLÍTICA, muitas vezes a versão prevalece sobre os fatos. Essa é uma citação de um conterrâneo meu, José Maria Alkmin, à qual recorro sobretudo diante de situações em que são postos graves questionamentos elaborados a partir de premissas equivocadas ou a partir de conclusões apressadas. Ou mesmo, temos de considerar, por má-fé.

Recentes críticas direcionadas à ampliação da faixa etária dos filhos de beneficiários do programa Bolsa Família me remetem a essa reflexão e, por isso, sinto-me na obrigação de esclarecer certos pontos nesse debate.

Tal ampliação não é um assunto novo, tendo sido amplamente discutida ao longo de 2007. Por ocasião do anúncio do reajuste do benefício, em julho, essa proposta já estava colocada publicamente. Dentre os motivos que estimularam a mudança, estava a necessidade de estender o estímulo à permanência e freqüência à escola aos jovens adolescentes de 15 até 17 anos, já que pesquisas indicavam aumento da evasão escolar nessa faixa etária.

Na mesma época, se elaborava, na Secretaria Geral da Presidência da República, o novo Projovem -um conjunto de políticas específicas para a juventude, articulando iniciativas de vários ministérios.

O Projovem, reformulado, introduz no Brasil um padrão internacional de conceituação de juventude, que define a faixa etária entre 15 e 29 anos, em que se identificam três grupos: os adolescentes-jovens (15 a 17 anos), os jovens-jovens (18 a 24 anos) e os jovens-adultos (25 a 29 anos).

Dentro desses três grupos, o programa se estrutura em quatro modalidades: o Projovem Adolescente, o Projovem Urbano, o Projovem Campo e o Projovem Trabalhador. O Projovem Adolescente, modalidade sob responsabilidade do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), resulta da reformulação do Agente Jovem, já então destinado a adolescentes de 15 a 17 anos, e visa a ampliação da escolaridade (ao incentivar a permanência na escola por meio da articulação com o Bolsa Família), a qualificação para o mundo do trabalho (por meio de cursos) e o desenvolvimento humano integral (engajando os jovens em atividades de cultura, esporte, lazer, inclusão digital e ação comunitária).

Em outubro de 2007, o governo enviou ao Congresso Nacional o projeto de lei 2.204, que regulamenta o Projovem, que não foi votado. Dada a relevância do tema juventude e as adequações administrativas necessárias à sua implementação já no início de 2008, garantindo a continuidade de ações em andamento, o governo editou medida provisória que dispõe sobre o Projovem e altera a lei 10.836/2004, que regulamenta o Bolsa Família, ampliando a idade limite para receber o benefício variável de 15 para 17 anos.

A extensão proposta para o Bolsa Família foi, assim, articulada à modalidade "adolescente" do novo Projovem como parte de uma acertada estratégia de promover a integração das políticas sociais voltadas à juventude, público mais exposto à violência e ao desemprego.

O benefício nessa faixa etária continua sendo pago diretamente ao titular do cartão, geralmente a mãe -e não a eventuais "novos eleitores", como criticam alguns-, contribuindo para o fortalecimento dos vínculos familiares.

A opção pela edição de medida provisória não anula, como não anulou, o debate democrático que promove o aperfeiçoamento dos programas. Vale lembrar que o próprio Bolsa Família foi primeiro instituído por medida provisória, em outubro de 2003, transformada em lei depois do devido debate no Congresso Nacional, em janeiro de 2004.

Pesquisas realizadas pelo MDS e por diferentes instituições mostram que o Bolsa Família, efetivamente, chega às famílias mais pobres do Brasil; que as famílias atendidas pelo programa têm se alimentado mais e melhor, contribuindo para assegurar o direito humano à alimentação adequada; e sua relevância para a queda da desigualdade nos últimos anos. Tais evidências apontam a importância e o potencial do Bolsa Família.

No entanto, temos de ter clareza de que ele não é um programa isolado. Integra, de maneira estratégica, uma rede de políticas que deve ser aperfeiçoada para cumprir os objetivos de proteger e promover os pobres, na perspectiva da desejada emancipação social.

Esse é o propósito que une as pessoas de bem, comprometidas com a justiça social, que tratam as políticas sociais de forma republicana e suprapartidária, como uma responsabilidade do poder público com a melhoria da qualidade de vida de nossos cidadãos, principalmente daqueles historicamente alijados do processo de desenvolvimento do país.

*PATRUS ANANIAS, 55, advogado, é o ministro do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Foi prefeito de Belo Horizonte (1993-1996).

Publicado originalmente no dia 11/02/2008, pelo jornal Folha de São Paulo