Acervo
Vídeos
Galeria
Projetos


Entrevista: Regina Novaes

Secretária adjunta Nacional de Juventude fala sobre o Conselho Nacional de Juventude, suas perspectivas de atuação, o andamento do Pró Jovem e a crise no governo Lula

Observatório Jovem   09.08.2005

Ibasenet - Perseguindo o objetivo de uma Política Nacional de Juventude, nos dias 2 e 3 de agosto, houve a posse e a primeira reunião do Conselho Nacional de Juventude, que contará com um terço de seus membros provenientes do poder público e dois terços da sociedade civil.

IbaseNet – Qual a composição do Conselho Nacional de Juventude?
Regina Novaes –
O conselho é composto por 60 membros. Do lado do poder público, temos 16 ministérios com programas voltados para a juventude, como a própria Secretaria Geral, o Ministério do Trabalho e Emprego, o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome etc. Também fazem parte do conselho, a convite do ministro Luiz Dulci, três entidades que não são exatamente poder público, mas representam instâncias de poder. A Frente Nacional de Prefeitos e a Confederação Nacional de Prefeitos indicaram dois representantes, um titular e um suplente. Tem relação com a idéia do pacto federativo. No âmbito estadual, foi convidado o Fórum dos Gestores Estaduais. Também foi convidada a Frente Parlamentar de Juventude, que representaria o Legislativo. Ao todo são 20 cadeiras para o poder público, ou seja, um terço das vagas dos conselhos.

IbaseNet – A mistura de diferentes ministérios e de diferentes âmbitos, federal, estadual e municipal, é uma estratégia de atuação coordenada, evitando desperdício de recursos e replicação de iniciativas?
Regina Novaes –
Sim. O princípio básico é não deixar que as questões voltadas para a juventude fiquem umas de costas para as outras. Em cada lugar, existem ações voltadas para a juventude sem informações sobre o que está ocorrendo no ministério vizinho. Sem dúvida, a função é otimizar e construir um novo paradigma do que seria política pública para a juventude. Não pensar a juventude apenas como uma extensão da infância e da adolescência ou, ao contrário, que você tem que trazer a maturidade para a juventude. É pensar que momento específico é esse, o que é ser jovem no Brasil de hoje, com o desemprego e a violência atingindo todas as classes sociais.

IbaseNet – E como ficou a representação da sociedade civil?
Regina Novaes –
Os outros dois terços são de representações da sociedade civil, entidades que atuam em defesa e promoção dos direitos da juventude. São muito diferenciadas. Levamos em conta cinco critérios: reconhecimento das organizações nacionais; iniciativas regionais ou de redes temáticas; pluralidade de organizações com acúmulo no campo da juventude; segmentos da juventude (negros, mulheres, rural, urbano etc); especialistas. O conselho procura ser plural.
No âmbito nacional, acreditamos que nenhuma organização de juventude tenha ficado de fora. No caso do hip hop, por exemplo, existiam duas vagas e cinco entidades, então elas se reuniram, debateram e apontaram os nomes dos conselheiros. Entre as entidades nacionais temos a UNE, a UBES, setores de juventude de centrais sindicais, Pastoral da Juventude, União dos Escoteiros do Brasil etc. Em um segundo momento, escolhemos redes e regionais, embora saibamos que falar em redes é algo um pouco difícil, pois existem aquelas mais estruturadas, outras nem tanto. Mesmo assim, fizemos questão de reconhecê-las, pois achamos uma forma de organização atual e importante.
Depois, começamos a buscar segmentos que representam desigualdades ou diferenças sociais. Foi uma tentativa de trazer todos os grupos discriminados: jovem indígena, deficiente, mulher, homossexual, quilombola etc. Outro critério foram ONGs ou fundações que, nos anos 1990 e começo de 2000, acumularam alguma experiência na área da juventude. Foi aí que entrou o Ibase. Em alguns casos, pedimos que fossem feitas composições: o Ibase, por exemplo, compõe com Criola. O Viva Rio com Rocinha 21 e o Sou da Paz com o projeto Casulo, da periferia de São Paulo. Ou seja, o titular é de uma organização e o suplente de outra. As vagas do conselho não são elásticas, mas podemos, de alguma forma, trazer a diversidade o máximo possível.
O último critério foi o de especialistas. Consideramos tanto a parte mais acadêmica, como pessoas com áreas de especialidade. O Marcelo Yuca, por exemplo, não é um especialista no sentido acadêmico, mas passou por uma trajetória de vida que o transformou em importante porta-voz nessa área.

IbaseNet – Foi levada em conta a diversidade regional na escolha das entidades e de conselheiros(as)?
Regina Novaes –
Foi buscada a diversidade regional, mas nem sempre conseguimos. A Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar da região Sul, Fetraf, por exemplo, nasceu no Sul, mas considerou muito importante colocar alguém da Bahia como conselheiro, local que já estava representado. A gente delega e tem que aceitar o que vem. Mas tentamos, ao máximo, buscar a diversidade regional, embora sabendo que não poderíamos reinventar a história. Se há acúmulo em determinado lugar, não podemos passar a borracha. Mas uma coisa é importante ressaltar, embora as vagas do conselho não estejam bem distribuídas em termos regionais, todas elas estão representadas.
Uma maneira de corrigir os possíveis desequilíbrios são as câmaras temáticas: educação, trabalho, vida saudável, vida rural, violência, direitos humanos etc. O conselho irá se reunir apenas quatro vezes ao ano. Nos intervalos, a idéia é que as câmaras temáticas se organizem e produzam tanto um diagnóstico da questão sobre a qual estão trabalhando como recomendações para o estado e para a sociedade civil. O próprio conselho irá propor essas câmaras aos conselheiros. Esperamos que ampliem a participação. Que as pessoas que ficaram de fora do processo do conselho sejam recuperadas nas câmaras temáticas. Esse é um elemento muito importante de ampliação do conselho.

IbaseNet – O perfil de conselheiros(as) também é diversificado?
Regina Novaes –
Bastante variado. Em termos de cor, temos certeza de que ficou bem variado, mas na semana que vem vamos pedir para as pessoas se autoclassificarem para podermos fazer as estatísticas. Em termos de homens e mulheres, está bem eqüitativo. Uma coisa bem importante é a questão da idade. Não consideramos a idade como um pré-requisito. Não podemos impor, mas acreditamos ser importante uma relação intergeracional dentro do conselho. É preciso mais do que os jovens para ajudar a pensar a relação intergeracional. Não posso dizer que ficou meio a meio, mas é quase isso em termos de pessoas com mais e com menos de 29 anos. Ou seja, tem uma participação forte dos jovens.

IbaseNet – A maior parte das vagas do conselho foram para a sociedade civil. Existe algum motivo especial?
Regina Novaes –
Essa foi uma decisão nossa. A juventude é muito segmentada e variada. Se você quisesse pegar as experiências, era preciso que a sociedade civil tivesse mais lugares. Se tivéssemos feito um conselho paritário, não íamos conseguir a pluralidade, formas de participação tão variada. Tem algo importante também que seria legal ressaltar. Alguns conselhos tem na presidência alguém do governo, outros, como o Consea, alguém da sociedade civil. Fizemos um esquema bem interessante. Vamos alternar, um ano quem irá presidir será a sociedade civil, no outro, o governo. Neste primeiro ano, a presidência será do governo, que indicará o seu membro. A sociedade civil irá indicar alguém para a vice-presidência. Daqui a 20 dias, a sociedade civil estará inscrevendo as indicações para a vice-presidência. Em agosto do ano que vem, será o contrário. Há um decreto de lei que estabelece tudo isso, mas o regimento interno do conselho será construído pelo próprio conselho. Na próxima reunião, extraordinária, em setembro, deverão ser eleitos o regimento interno e o representante da sociedade civil para a vice-presidência.

IbaseNet – Qual será o trâmite entre a Secretaria Nacional de Juventude e o conselho?
Regina Novaes –
A secretaria tem a obrigação de disseminar as questões que forem surgindo, mas a sociedade civil também. A secretaria tem a função de articular as políticas, de integrá-las, mas não tem poder maior que um ministério. Por isso, a repercussão das opiniões do conselho, que é um espaço de interlocução com a sociedade civil, pode ajudar a secretaria. É meio o contrário. Não é a secretaria que ajuda o conselho, mas o conselho que ajudará a secretaria.

IbaseNet – Qual a função do conselho?
Regina Novaes –
A primeira coisa importante é a sua tarefa de priorizar as questões urgentes de juventude. Ele precisa emitir um parecer e recomendações para políticas públicas de juventude. A idéia é que em nossa reunião extraordinária, em setembro, já ocorra uma primeira reunião das câmaras temáticas [propostas em 3 de agosto, quando houve a primeira reunião do conselho]. O conselho não é deliberativo. Não vai dizer, por exemplo, o que o Ministério do Trabalho tem que fazer com relação ao primeiro emprego, é consultivo e propositivo. Mas acreditamos que quando as câmaras temáticas produzirem material de maneira séria, plural, com bastante dados e recomendações irão conquistar uma legitimidade que irá constranger quem não quiser levá-las em conta.

IbaseNet – O conselho irá influir no Programa Nacional de Inclusão de Jovens (Pró Jovem) – iniciativa que prevê a capacitação de jovens de 18 a 24 anos, fora do sistema escolar e do mercado de trabalho, com recebimento de bolsas e prestação de trabalhos comunitários?
Regina Novaes –
Sem dúvida. O Pró Jovem é o único programa que a secretaria está executando. Os conselheiros vão entrar em contato com os seus objetivos, problemas, avanços etc. Assim, irão poder pensar em como melhorar o Pró Jovem. Queremos transformar o conselho em um lugar de validação de políticas públicas para a juventude e de acompanhamento, críticas, recomendações.

IbaseNet – Como está o encaminhamento do Pró Jovem?
Regina Novaes –
Muito interessante. Já teve início em cinco capitais. Em 5 de agosto, terá início em mais 5. Até o final do ano, estará nas 27 capitais. Já têm muitos jovens inscritos. Já ouve inscrição e sorteio público em 10 capitais. Todas as vezes que a inscrição supera o número de vagas para determinado município é feito sorteio público em Brasília, para poder haver um critério universal. Essa foi a primeira vez que foi pensado um programa nacional para atingir 200 mil jovens do Brasil, até o final do ano, só nas capitais. É a primeira vez que um programa integra ação curricular, elevação de escolaridade, capacitação para o mundo do trabalho e ação cidadã.

IbaseNet – Qual a vantagem disso?
Regina Novaes –
A gente gostaria muito que essa outra maneira de pensar a relação escola, trabalho e cidadania, que está no Pró Jovem, possa influenciar tanto o trabalho de educação de jovens e adultos como a escola regular. Que a forma de organização do currículo da escola regular seja repensada. A capacitação que oferecemos tem todo um material pensado para a juventude. As quatro unidades formativas do Pró Jovem são: o jovem e a cidade; o jovem e o trabalho; o jovem e os meios de comunicação; e o jovem e a cidadania. Todas as disciplinas são ministradas de acordo com esses eixos temáticos. Mas tudo isso aprendendo matemática, ciências naturais etc. O jovem vai aprender todas as questões curriculares fundamentais por meio desse livro.

IbaseNet – Esse aprendizado se dará na escola comum?
Regina Novaes –
Isso depende da capital. Algumas conseguiram horário para fazer tudo dentro das escolas, da sua rede. Outras conseguiram uma parte nas escolas, outras nas igrejas, em clubes. É preciso ter salas de aula disponíveis nas periferias perto das casas dos jovens. É um curso à parte do currículo comum das escolas, pode até funcionar na escola, mas é à parte. São 12 meses, o jovem vai ganhar R$ 100 por mês. A gente sabe que é apenas uma forma de ele poder se segurar nesses 12 meses, mas sabemos que R$ 100 não segura. O que vai segurar realmente é a forma como está organizado o curso, a maneira de aprender.

IbaseNet – Até o final do ano vão conseguir atingir os 200 mil jovens?
Regina Novaes –
Vamos. Está muito bem encaminhado para isso. Todos os prefeitos estão aderindo à parceria e percebendo a importância do Pró Jovem.

IbaseNet – E a secretaria está com recursos suficientes para o seu pleno funcionamento?
Regina Novaes –
É uma secretaria sem muitos recursos. Agora, quem tem os recursos é o Pró Jovem, R$ 311 milhões. A gente tem que reconhecer que os recursos do Pró Jovem têm sido respeitados, não foram contingenciados. Houve um sinal político muito importante. A secretaria ainda é muito voltada para o Pró Jovem e para o conselho.

IbaseNet – De que forma a secretaria está vendo as denúncias que afetam o governo Lula?
Regina Novaes –
Toda essa crise choca, preocupa, chega a decepcionar, mas acho que a nossa atitude na secretaria tem sido muito a de participar, estar atento, ser a favor de toda e qualquer investigação. Isso é algo muito importante para o país. A transparência é muito importante. Mas a posição da gente está sendo muito a de tocar o trabalho para a frente. Não deixar que essa situação toda contamine o nosso entusiasmo. Quando você vai para a base, para as cidades, e vê 2.400 com jovens, alguns com filhos, agarrando essa chance de participar do Pró Jovem, com a possibilidade de inclusão social, você coloca a crise entre parênteses e toca o trabalho. Essa tem sido a nossa postura. Não estamos dando uma de avestruz, estamos acompanhando o que está acontecendo, mas a nossa escolha é a de trabalhar tudo o que for possível, da melhor maneira possível.

Confira a lista de conselheiros(as).

Publicado no Ibasenet em 1/08/2005.