O filme “Antônia” é o mais novo longa-metragem da cineasta Tata Amaral (diretora também dos filmes “Céu de estrelas” e “Através da janela”) e narra a história de quatro jovens mulheres negras moradoras da Vila Brasilândia, periferia de São Paulo
Ele é protagonizado por quatro cantoras de rap e/ou black music: Negra Li, Leilah Morena, Quelynah e Cindy, seguindo a trilha de outros filmes que optam por “não-atores/ atrizes” em seu elenco.
As quatro protagonistas se conhecem desde a infância e têm em comum o sonho de fazer sucesso como cantoras de rap, mas também as dificuldades enfrentadas por mulheres negras e pobres moradoras de favelas e periferias do Brasil. Com experiência como backing vocals em grupo de rap de homens, Preta (Negra Li), Barbarah (Leilah Moreno), Mayah (Quelynah) e Lena (Cindy) decidem montar seu próprio grupo, chamado Antônia (o nome é também parte da história de todas elas, já que as quatro tiveram avôs chamados “Antônio”). O filme mostra o início do grupo, as dificuldades de conquistar espaço para se apresentar, mesmo entre amigos do Hip Hop, a descoberta por um “empresário” (Marcelo Diamante, interpretado pelo rapper e precursor do Hip Hop no Brasil, Thaíde) e algumas dificuldades enfrentadas por mulheres que almejam “viver do rap”.
O forte do filme, porém, não é a relação delas com a música e com o Hip Hop, apesar de a música pontuar o filme o tempo todo. O enredo de Antônia traz para as telas o cotidiano de muitas jovens mulheres negras da periferia, marcado pelas dificuldades para viver em uma metrópole desigual e em uma sociedade machista. Apesar de as personagens Preta e Barbarah terem centralidade na história, que é narrada em off pela segunda, os dilemas e conflitos vividos pelas outras duas protagonistas e também por outros personagens (destaque para filha e mãe de Preta, vividas por Nathalye Cris e Sandra de Sá e que, na minissérie da Rede Globo, ganham maior atenção) sustentam a trama sem deixar que a história caia em um maniqueísmo fácil.
O filme, no entanto, não é pessimista. Ao contrário, revela o jogo de cintura dessas mulheres que habitam um Brasil cheio de nuances e complexidades. O que se percebe são flashes de quatro trajetórias de vida, onde a cumplicidade entre elas, mas também as dificuldades compartilhadas (brigas com maridos e namorados machistas, se tornar mãe, ter que se sustentar, ciúmes entre amigas, relação com a família etc) acabam por desvendar um pouco da vida das mulheres negras e pobres no Brasil.
Além das quatro protagonistas, uma quinta se revela: Vila Brasilândia. O cenário da narrativa acaba sendo personagem que, assim como as demais, é mostrada com bastante sensibilidade através de suas ladeiras, dos shows de Hip Hop, do jogo de futebol, das casas, dos evangélicos etc.
O filme foi antecedido por uma minissérie para a televisão veiculada pela Rede Globo às sextas-feiras à noite entre novembro e dezembro de 2006. Os episódios se passavam quatro anos após o término da história do filme e bateram recorde de audiência em seu horário (já no primeiro episódio obteve 32 pontos e 53% de share, segundo o Ibope). A Rede Globo já contratou uma nova temporada televisiva e vem investindo na divulgação do filme e no trabalho solo de suas protagonistas como cantoras (na trilha da minissérie, cada uma lançou e divulgou seu CD solo na emissora). A série, ainda que traga uma estética diferenciada em relação ao filme (as protagonistas aparecem mais produzidas do que no filme, que parece seguir uma linha mais próxima da “realidade” da periferia), tem o mérito de, a exemplo de “Cidade dos Homens” com os jovens de favela, trazer para o grande público o cotidiano e a luta de mulheres negras da periferia através de personagens que assumem as rédeas de seu destino e, apesar das muitas situações adversas, encontram no grupo a possibilidade de continuar sonhando e lutando por seus sonhos.
Ficha Técnica
Direção TATA AMARAL
Produzido por GEÓRGIA COSTA ARAÚJO eTATA AMARAL
Co-produtores ANDREA BARATA RIBEIRO, BEL BERLINCK e FERNANDO MEIRELLES
Produtor Associado GUEL ARRAES
Produção Executiva GEÓRGIA COSTA ARAÚJO e MOA RAMALHO
Roteiro ROBERTO MOREIRA e TATA AMARAL
Musica BETO VILLARES e PARTEUM
Fotografia JACOB SARMENTO SOLITRENICK
Som Direto JOÃO GODOY
Desenho de Som EDUARDO SANTOS MENDES
*Patrícia Lânes, antropóloga, pesquisadora do Observatório e do Ibase e autora da dissertação “Em busca da auto-estima: Interseções entre gênero, raça e classe na trajetória do grupo Melanina”