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Reportagens

Reportagens

A Juventude e a Nova constituição Boliviana

Durante os dias 26, 27 e 28 de março, jovens de organizações sociais de sete dos nove estados da Bolívia estavam reunidos em Sucre para elaborar e entregar propostas  à Assembléia Constituinte. Em Sucre, residem 61.656 jovens com idade entre 15 e 24 anos. De uma parcela dessa juventude pretendeu se aproximar essa aprendiz de repórter diretamente de Sucre para o Observatório Jovem

Se solicita guerreiros. Menos camisetas e mais revolução!!! Nada é fácil”

Com essas palavras projetadas na tela branca acompanhadas de fotos de Che Guevara e do fundador do Partido Socialista na Bolivia Marcelo Quiroga Santa Cruz um jovem iniciou a apresentação de propostas surgidas do Segundo Ampliado Nacional de Juventude das Organizaçoes Sociais do Campo e da Cidade.

Durante os dias 26, 27 e 28 de março, jovens de organizações sociais de sete dos nove estados da Bolivia estavam reunidos em Sucre para elaborarem e entregarem propostas  à Assembléia Constituinte. Muitos dos presentes em Sucre participaram no final de semana anterior de um outro encontro, dessa vez em Cochabamba, da juventude do Partido Movimiento ao Socialismo (MAS), partido do presidente da Bolivia Evo Morales.

Entre as propostas aprovadas, foi ratificada a demanda do voto aos 16 anos, a possibilidade de ser eleito aos 18 e a expansão do ensino superior para as áreas rurais. “Temos que garantir também saúde, trabalho, educação e terra para a juventude. Se não garantimos isso estamos usando os jovens para ganhar eleições. É um mero fazer a juventude pensar que é útil se apenas conseguimos que seja aprovado o voto aos 16 anos”, critica o jovem Edgar Choque, do Movimiento Che Guevara.

Ao final do evento, as propostas foram entregues à constituinte Maria Oporto (MAS), que se comprometeu com a juventude presente. “Eu vos asseguro que nós, constituintes jovens, nos comprometemos a fazer prevalecer essas propostas. São as melhores que chegaram até hoje. Eu acredito que estão saindo realmente dos jovens mais revolucionários do país”, diz.

Muitos presentes ressaltaram que é necessário que se faça uma mudança profunda na economia do país para que se garanta as demandas da juventude. Foram elaboradas também propostas de visão de país como a recuperação do controle total do estado sobre os recursos renováveis e nao renováveis.  As demandas específicas incluíram a criação de um Ministério de Juventude,  a criação de centros de reabilitação para jovens usuários de drogas e “imersos na deliqüência e prostituição”, garantia de primeiro emprego, entre outras.

Depois da coletiva de imprensa para a apresentação das propostas, novamente se abriu a discussão e outras propostas surgiram. A garantia de direitos sexuais reprodutivos foi uma das demandas apresentadas depois da sistematização. O tema gerou polêmica. “Se nos consideramos realmente revolucionários não podemos permitir o aborto”, rechaça um jovem. “A sexualidade é um tema mais amplo, que tem a ver também com a saúde. Sabemos que todos os dias morrem jovens mulheres em tentativas de aborto”, responde uma jovem.

A mesa diretiva do encontro encontrou uma saída para as propostas surgidas depois da sistematização. Serão discutidas em um novo ampliado de jovens que será realizado na segunda quinzena de Abril.

Nova Constituição Boliviana. E a juventude?

 A atual Constituição da Bolívia data de 1967 e foi revista em 1994.  Está em curso o processo de construção da Nova Constituição Política de Estado (CPE) da Bolívia; de 255 assembleístas responsáveis pelo novo texto, 19 têm idade entre 22 e 28 anos. Sucre, no estado de Chuquisaca,  é a cidade sede da Assembléia Constituinte. Os atuais redatores foram eleitos em suas cidades ou povoados, nos nove estados do país.

 Em Sucre, segundo dados de 2006 do Instituto Nacional de Estadísticas (INE) da Bolívia, residem 61.656 jovens com idade entre 15 e 24 anos. De uma parcela dessa juventude pretendeu se aproximar essa aprendiz de repórter diretamente de Sucre para o Observatório Jovem. Realizamos, em março de 2007, sondagem de opinião na cidade com 382 estudantes secundaristas e universitários. As respostas mostraram que a grande maioria (37%) dos entrevistados não acredita que a juventude está representada na Assembléia Constituinte, apesar de 87% acreditar que o novo texto vai ser bom, ainda que seja só para uma parte da sociedade boliviana.

 “Na Assembléia Constituinte há muito poucas pessoas jovens. Mas também é, às vezes, contraditório o desejo dos jovens de participar e ter, realmente, a participação efetiva. Eu creio que essa quantidade pequena de jovens também tem a ver com os cenários de atuação que agora priorizam a juventude e que não são esses”, comenta a jornalista da Rede Erbol de rádios e ex-militante de movimento de mulheres jovens, Nancy Vacaflor.

 Diferente de outras eleições na Bolivia, a partir de 18 anos se poderia concorrer à função de constituinte. Entretanto, não há assembleístas com idade inferior a 22 anos.

 Os/as jovens entrevistados/as também avaliaram a atuação dos assembleístas e, entre outras questões, responderam o que deveria constar na CPE em benefício da juventude.

 
Jovens constituintes

 Observando as plenárias da Assembléia Constituinte no centenário teatro Gran Mariscal, alguns rostos parecem ter menos traços de idade. O Observatório Jovem foi conversar com alguns destes. A resposta ao pedido de entrevista foi positiva em todos os casos e a oportunidade de expressar as idéias pareceu bem vinda aos assembleístas.

 “Já estamos tomando posições de adultos, mas a juventude deve se sentir representada porque vamos reivindicar os direitos e tudo o que possamos lograr na nova Constituição para que os jovens não sejam discriminados no trabalho, na vida política do Estado, no econômico, porque começar um trabalho para os jovens ainda é muito difícil porque pedem experiência”.

 A declaração é do constituinte Carlos Aparicio Vedia, eleito aos 24 anos. Aparicio é representante do município de Vila Azurduy, onde é presidente da juventude do partido majoritário na assembléia: Movimiento ao Socialismo (MAS).

 Na pergunta sobre que temáticas gostariam de ver incluídas na Constituição, a terceira proposta mais citada  pelos/as jovens foi  ter mais oportunidades de trabalho. A melhoria da educação, com novas escolas públicas, bibliotecas, mais vagas nas universidades e bolsas de ensino, ocupou o primeiro lugar. A segunda proposta mais citada foi a possibilidade de maior participação política da juventude.

 Dos seis jovens constituintes entrevistados, cinco têm com uma das principais propostas para a juventude uma maior participação nas decisões públicas. Diferente do Brasil, onde se pode votar a partir dos 16 anos, aqui na Bolívia o direito ao voto é conquistado aos 18 anos.

  “Temos pleiteado que em nosso país os jovens deveriam votar desde os 16 anos e também ser eleitos desde 18. Porque pleiteamos isso? Porque sabemos que há jovens com grande experiência, que viveram nos campos sindicais e não têm essa possibilidade de serem autoridade pública.”, explica a constituinte Margarita Terán, de 24 anos, eleita pelo estado de Cochabamba e membro do Movimiento Bolivia Livre (MBL).

 Juan Carlos Velarde Melgar, de 26 anos, constituinte eleito pelo município de Guayaramerín e membro do partido Poder Democrático e Social (PODEMOS) endossa a proposta. “A atual Constituição estabelece como requisito 25 anos para ser candidato à deputado, para prefeito, 21, para senador e presidente 35 anos. As pessoas mais velhas legislam os interesses das pessoas mais novas, isso não é coerente porque as pessoas mais velhas têm outros critérios. Então, o que propomos é que na nova Constituição se abaixe a idade, não para ser presidente, mas para ser deputado, prefeito e vereador aos 18 anos.”

  A participação anterior em movimentos sociais de suas regiões e também no movimento  estudantil foi o que possibilitou a chegada de quatro dos seis entrevistados à constituinte. É o caso de Carlos Aparicio Vedia (MAS), Margarita Terán Gonzales (MBL), Marcela Choque Barrionuevo (MAS) e Elisa Vega Sillo (MAS).

 Juan Carlos Velarde Melgar (Podemos) e Catherine Mariaca Jaime do partido Movimiento Nacionalista Revolucionario (MNR) afirmaram terem sido convidados para se candidatarem à Assembléia Constituinte pelos respectivos partidos por não terem participado antes de nenhum tipo de movimento.

 Chama a atenção a história da constituinte Margarita Terán. “Eu comecei como dirigente sindical de uma zona produtora de folha de coca, Xapari, em 97. Estava com 14 anos quando fui eleita dirigente executiva da federação de mulheres. Eu estudava no colégio e aí era presidenta. Com o apoio das organizações sociais, de minha mãe, que não sabe ler nem escrever, e do meu pai que também não sabe, assisti a um congresso e me elegeram como executiva”, conta.

 
 Mais dados da pesquisa

 Entre as oito perguntas respondidas pelos/as jovens, a última se referia à participação coletiva deles e delas. Se por um lado a trajetória de Margarita permite pensar nesse tipo de participação na Bolivia, por outro, a juventude de Sucre mostra que a realidade dos/das jovens também pode ser vista por outro ângulo.

A grande maioria dos/das entrevistados/as (79%) disse não participar de nenhuma espécie de grupo, 20% respondeu afirmativamente e 1% não respondeu. Da porcentagem que afirmou a participação, a maior parte  (37%) faz parte de grupos religiosos, seguida por grupos políticos (23%) e esportivos (22%).

 “Os jovens estão pedindo mais participação, mas não se organizam. Isso é uma grande debilidade que a juventude tem, não ser organizada para conseguir o que quer”, fala a jovem participante do Consórcio Boliviano de Juventudes – Conbojuv, Farida Valdez Torres.

 Outro dado revela que os/as jovens entrevistados/as fazem uma avaliação negativa dos/das assembleístas. Na pergunta dirigida “O que pensa sobre os constituintes?” 71% dos jovens marcou a opção na qual dizia que apenas alguns exercem bem a função para a qual foram eleitos e 19 % a opção nenhum a exerce bem. Os questionários mostraram ainda que uma porcentagem pequena conhece os constituintes jovens, apenas 14%.

 Para a professora do curso de Comunicação Social da Universidade boliviana Universidad Mayor, Real Y Pontificia San Francisco Xavier de Chuquisaca, Carla Garrón, os meios de comunicação têm uma parcela de culpa na imagem que a juventude tem sobre os constituintes e também no desconhecimento deles acerca dos assembleístas jovens .

 “Os meios de comunicação têm muito a ver com essa situação porque às vezes  ressaltam apenas alguns constituintes e os demais estão invisíveis, então passam a imagem de que apenas alguns trabalham”, afirma.

 “Da mesma forma que ressaltam muito os aspectos negativos. Quem são os mediadores entre os constituintes e a população? Sao os meios de comunicação. Lamentavelmente mostram apenas os líderes políticos de sempre, por isso talvez esse desconhecimento sobre os assembleístas jovens”, continua.

Expectativas

 “Sabe me dizer quem foi Marcelo Quiroga Santa Cruz?”. Diante da pergunta sobre o personagem histórico boliviano que dá nome a uma das escolas visitadas,  responde um jovem: “foi um grande líder revolucionário”. Ao falar, estava contente, talvez por Marcelo Quiroga ser admirado por ele, talvez por saber responder à pergunta, ao contrário dos outros colegas que o acompanhavam.

 Apesar da avaliação negativa dos constituintes, os/as jovens têm boa expectativa com relação ao novo texto. 32% marcaram a opção “boa para os bolivianos e bolivianas” e 15% responderam “muito boa para os bolivianos e bolivianas”.

 Uma grande porcentagem, 40%, optou pela resposta “boa apenas para uma parte dos bolivianos e bolivianas”. As outras duas opções “Não vai ser boa para ninguém” e “Não sabe” tiveram respectivamente 7% e 6%.

 Os/as entrevistados/as que responderam a opção “boa apenas para uma parte dos bolivianos e bolivianas” teriam que responder também,  de forma espontânea,  para que parte seria boa a Constituição. Entre as respostas mais citadas estão “para os campesinos” (20%), “para os pobres” (16%) “para os indígenas” (15%) e “para os políticos” (15%).

A Bolivia vive um momento histórico com a construção da Nova Constituição. As políticas do presidente da República Evo Morales, um representante indígena–campesino, como a maioria da população boliviana, gera muita discussão. Há uma valorização, como nunca antes, da cultura campesina e originária. Um grande número de constituintes são do campo e/ ou indígenas, pessoas que antes não estavam nas esferas de decisão. 

 Há posicionamentos diversos em relação ao momento político do país. Não se pode falar em um apoio da juventude ao presidente Evo Morales, tão pouco em um rechaço. De maneira geral, se pode apostar em uma visão mais positiva, com relação ao poder executivo, da maioria dos jovens originários e campesinos, porque acreditam na representatividade do presidente.

 Como mostra a sondagem de opinião, a juventude entrevistada percebe um  direcionamento nas políticas de Evo Morales, como explica Nancy Vacaflor.

 “Os jovens indentificam (sic) claramente que como as políticas de governo estão muito orientadas para os campesinos, para os indígenas, para a classe mais empobrecida, também a Constituição vai responder a essas classes, aos setores excluídos historicamente”, comenta.

Esperança de mudanças

 A enfermeira Elisa Vega (MAS) é a assembleísta mais jovem, com 22 anos. “Queremos que, como vivemos todos em uma mesma Bolívia, que exista igualdade em todos os aspectos, econômicos, sociais, tanto na cidade quanto no campo”, assim responde à pergunta do Observatório Jovem sobre como, para ela, deve ser a Nova Constituição Política de Estado.

 Ao final da entrevista, Elisa disse que queria mandar um recado ao Brasil. “Quero mandar um saúdo à República do Brasil, e dizer que aqui na Bolívia estamos vivendo um processo de mudança e que todas as pessoas que são pobres estão em luta por esse processo para que não seja só aqui, mas em toda a América.”

 Apesar das estatísticas sobre a organização juvenil, o estudante e também participante do Conbojuv, José Manuel Camargo, analisa que a conjuntura atual pode favorecer essa organização. “Eu penso que esse é o momento de reunir os jovens e juntar as necessidades, porque se vamos gritando na rua sozinhos ninguém vai nos escutar, mas se nos unimos e gritamos juntos e o mesmo grito vão nos escutar e vamos conseguir algo”.

 Para concluir, a constituinte Elisa fala também aos jovens. “Aos jovens  eu peço que participem desse processo, começando por Bolivia e terminando por todo o que é centro-america e sudamérica. Que caminhemos! Nós jovens somos o presente de todo o mundo, então, o mundo está em nossas mãos.”.

Está dado o recado, Elisa!

Nota Metodológica

 Os questionários foram respondidos por 382 jovens, entre os dias cinco e onze de março, em seis colégios públicos, um colégio privado, e nas duas universidades da cidade - pública e privada.
 
 Para definir a quantidade de questionários a serem aplicados foi utilizada fórmula para saber o tamanho da mostra quando se conhece o universo sobre o qual se deseja pesquisar. A margem de erro estabelecida foi de 5%. Pelos dados do INE, o universo de jovens pesquisado está dividido em 49,8% pertencente ao sexo feminino e 50,1% ao masculino.
 
 Dessa forma, foram arredondados os valores e metade dos questionários foram respondidos por mulheres e metade por homens, tanto nos colégios quanto nas universidades. 
 
 Também foi respeitada as regiões dos colégios  - quatro centrais incluindo o privado e  três localizados em regiões periféricas da cidade.

Conheça também : INE – www.ine.gov.bo
Sobre a Nova Constituição Boliviana – www.apostamosxbolivia.org
                                                               www.mujeresconstituyentes.org

 Leia a outra matéria do Observatório Jovem relacionada: Trabalhadoras domésticas na Bolívia

*Fred Perez é estudante do 2º ano de Comunicacão Social da Universidade Mayor Real Y Pontificia San Francisco Xavier de Chuquisaca, em Sucre. Também acompanha os trabalhos da Assembléia Constituinte para o canal de televisao TV Católica.

Raquel Júnia é bolsista do Observatório Jovem do Rio de Janeiro/UFF, estudante do Curso de Comunicação Social da UFF e realiza intercâmbio universitário na Universidad Mayor Real Y Pontificia San Francisco Xavier de Chuquisaca, em Sucre, Bolivia.

Estudantes voltam às ruas no Dia Nacional de Luta Pelo Passe Livre

A 2ª edição do Dia Nacional de Luta pelo Passe Livre organizado pela UNE (União Nacional dos Estudantes) e pela UBES (União Nacional dos Estudantes Secundaristas) demarca o processo de lutas empreendidas pelo movimento estudantil secundarista ao longo da história e reafirma a importância do passe livre estudantil como garantia ao acesso a educação e aos bens culturais da cidade

Este ano, numa tentativa de mobilizar mais estudantes para o dia 22 de março, a UBES criou a Caravana Pelo Passe Livre que iniciou sua trajetória no dia 7 de março, percorrendo as capitais de Belo Horizonte, Salvador, São Paulo, Curitiba e retornando ao Rio de Janeiro, local de sua partida, dia 21 de março.

Calcula-se que estiveram presentes no lançamento da Caravana cerca de 500 estudantes que contaram com o apoio da população.  A caravana percorreu essas cidades levando diretores da UBES, uma equipe de documentação e um grupo de teatro do Paraná. Promovendo debates nas principais escolas da cidade sobre questões da conjuntura nacional, da educação no Brasil e do passe livre estudantil. Também fizeram apresentações teatrais abordando a temática do passe livre.

No dia 22 de março de 2007, dia Nacional de luta pelo Passe Livre, milhares de estudantes, de norte a sul do país foram para as ruas, reivindicando o direito ao transporte público, ao acesso à educação e a ampliação do entendimento que uma boa formação também depende da ampliação do universo cultural dos estudantes.

No Estado do Rio de Janeiro, aconteceram duas mobilizações, uma em Niterói que aglutinou cerca de 300 estudantes e outra no município do Rio de Janeiro que reuniu mais ou menos 1.200 estudantes de diversas escolas públicas, tais como Pedro II, Amaro Cavalcanti, Inácio de Azevedo Amaral, Visconde de Cairu, Ferreira Vianna entre outras. 

A passeata percorreu o trajeto da Cinelândia a ALERJ (Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro) e teve como intenção denunciar a decisão do Tribunal de Justiça – já publicada em Diário Oficial – que considerou inconstitucional a lei municipal 3.167/2000 que garante o passe livre no município do Rio. Os estudantes entoavam diversos bordões, do tipo “uh é pé no chão, passe livre é a solução” ou “o dinheiro do meu pai não é capim, eu quero passe livre sim”.  Ao passar em frente ao Fórum fizeram um protesto vaiando os desembargadores e reafirmando que os estudantes não iriam perder o direito ao passe livre.  Para Alan Borges, primeiro vice-presidente da UBES, os estudantes “estão travando uma luta desleal com empresários e desembargadores que tentam cassar nossos direitos. Há três anos consecutivos os empresários e os deputados estão tentando articular a cassação e a inconstitucionalidade da lei dizendo que não há fonte de custeio para o pagamento do passe do estudante”.

A Associação Municipal de Estudantes Secundaristas do Rio de Janeiro criou uma comissão que está estudando os problemas jurídicos e tentando identificar possíveis soluções para a nova tentativa de cassação do passe livre pelo STJ.

As entidades estudantis secundaristas estão confiantes que serão recebidos pelo atual Governador do Rio, Sergio Cabral, um dos autores da lei do passe livre intermunicipal, pois no ano de 2002 a FETRANSPOR conseguiu na justiça que a lei do passe livre intermunicipal fosse considerada inconstitucional.  Por causa disto, na época, o governo enviou um projeto para a Assembléia Legislativa que reduziu o ICMS criando a fonte de custeio como compensação tributária.  Também querem agendar uma audiência com o Prefeito César Maia, pois para os estudantes a federação também quer conseguir na justiça redução do ISS.

A luta do passe livre estudantil é uma bandeira antiga do movimento estudantil, mas somente no final dos anos 80 os estudantes, do município do Rio de Janeiro, obtiveram o direito ao passe livre.  O município do Rio foi o primeiro que obteve a aprovação de projeto de lei.  Neste período ocorreram muitas passeatas e roletaços (pular as catracas), negociações com a Câmara Municipal, unificação dos grupos políticos que atuavam no interior do movimento estudantil secundarista, com o objetivo de pressionar o município para garantir acesso à educação e aos bens culturais, como cinema, exposições, bibliotecas e teatros.  Isso tornou a luta pelo passe livre estudantil uma possibilidade de democratização do acesso à informação, do ir e vir e do direito ao transporte público. 

Fotos: Claudio Paolino/Imagem e Cidadania

Marjorie Botelho, psicóloga, mestre em educação, coordenadora do Sobrado Cultural espaço educativo de comunicação e cultural, pesquisadora do Observatório Jovem e autora da dissertação Ação Coletiva Estudantil: Passe Livre na cidade do Rio de Janeiro. Niterói/RJ: Universidade Federal Fluminense - Programa de Pós-Graduação em Educação, 09/10/2006. Dissertação (Mestrado em Educação), 117 páginas. Acesse o resumo e texto completo da dissertação.


Veja mais notícias no site da União Nacional de Estudantes: www.une.org.br


Leia também Manifestação estudantil termina em confontro na Tijuca (Jornal Oglobo 23/03/2007)

Novos tempos para a antiga sede da UNE

Aproximadamente 150 estudantes estão acampados no terreno da antiga sede da União Nacional dos Estudantes. A intenção é fazer da sede no Rio de Janeiro um centro voltado para a cultura e para a memória do movimento

Estudantes exigem implantação de nova sede da UNE no Rio de Janeiro

 Estudantes continuam acampados na antiga, e provável futura, sede da União Nacional dos Estudantes. A entidade está na tentativa de retomar o prédio localizado na Praia do Flamengo. Após passeata que reuniu quase 600 pessoas, um acampamento foi feito no local. Um estacionamento funcionava ilegalmente no espaço desde a década de 1980, quando o prédio foi demolido. O local tem como estrutura quatro containeres e o espaço para estacionamento, onde estão montadas as barracas.

 Um muro cheio de desenhos coloridos e um velho portão de ferro separam a atual moradia de quase 150 estudantes da principal avenida da Praia do Flamengo, no Rio de Janeiro. Sob uma cobertura de amianto espalham-se as barracas coloridas, com nomes e frases de ícones da militância e outros ídolos. Os únicos locais totalmente protegidos do clima são os containeres já citados, onde estão instalados os banheiros químicos e os chuveiros.

 Inicialmente, o antigo prédio que serviu de sede para a UNE por mais de 40 anos era sede do clube Germânia. O clube foi desapropriado em 1942, quando o governo brasileiro assume uma posição contrária ao nazi-fascismo. Por exaltar o folclore alemão o clube passou a ser visto como reduto de simpatizantes nazistas. A entidade se aproveitou da situação criada pelo governo para ocupar o prédio, muito valorizado na época por se localizar próximo ao Palácio do Catete. Cerca de 700 estudantes ocuparam o prédio e exigiram que o presidente Getúlio Vargas doasse este para a UNE, que não possuía endereço fixo.

 Segundo Gustavo Petta, presidente da UNE, a retomada do prédio é uma forma de destruir resquícios da ditadura militar, uma vez que o prédio foi incendiado durante o governo de exceção. O foco do incêndio começou nos arquivos da UNE, numa típica queima de arquivos da ditadura militar. A estrutura do prédio foi fortemente abalada, assim como a estrutura da entidade após o incidente. A militância estudantil se tornou prática ilegal em todo o Brasil e os atores tiveram que se organizar clandestinamente. Abandonado, o prédio foi demolido na década de 80. Confrontos com a polícia e prisões de estudantes foram marcas dessa data, apesar da anistia já ter sido dada, a mobilização dos estudantes ainda era muito reprimida.
 
 A escritura do terreno fora devolvida à UNE pelo presidente Itamar Franco, em 1992. No entanto, a diretoria da entidade nessa época se disse crente na luta jurídica e não tentou se reempossar do imóvel. Para o atual presidente isso foi algo positivo, pois evitou confronto físico com os posseiros e até uma possível tragédia. Duas semanas antes da passeata que resultou no atual acampamento o prefeito César Maia havia interditado o local, mas por falta de fiscalização por parte da prefeitura o estacionamento continuava funcionando.

 No momento, aproximadamente 150 estudantes estão acampados no antigo estacionamento. Porém a organização destes é um problema enfrentado diariamente. Durante uma plenária, na qual seriam discutidas as regras do acampamento e a divisão das comissões que teriam que ficar no acampamento por segurança durante o carnaval, estavam presentes por volta de 20 pessoas. Segundo Petta as regras são rígidas devido à grande visibilidade que o acampamento tem na mídia e qualquer problema de comportamento individual pode refletir no processo judicial.

 A idéia da direção da UNE é manter as duas sedes da entidade no eixo Rio de Janeiro e São Paulo é fazer da primeira um centro voltado para a cultura, memória do movimento e pouco político. Já a sede de São Paulo será voltada principalmente para política e para a manutenção das relações com movimentos sociais e partidos políticos, além de permanecer no local onde há o maior contingente de estudantes universitários do Brasil. Ao ser questionado sobre a centralização do movimento estudantil no Sudeste, devido à implantação das duas únicas sedes da entidade nessa região, Gustavo disse que tem sido feito o esforço de descentralizar e fortalecer o movimento em outras regiões. Para Gustavo Petta, a  existência de duas sedes no Sudeste não pode ser motivo de inviabilizar nem subestimar a atuação da UNE no resto do país. Gustavo ressaltou também que a sede do Rio não poderia ser esquecida, depois de tantas lutas terem nela se fortalecido.

Tese mostra que escola reproduz a desigualdade social

A escola pública realiza processos desiguais de ensino de acordo com o nível sócio-econômico dos alunos. Foi sobre essa realidade que a pesquisadora do Observatório Jovem e professora da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) Mônica Peregrino falou no seminário Juventude, Escola e Desigualdades promovido pelo Observatório Jovem no dia 11 de dezembro

Uma escola localizada em bairro de classe média no Rio e que foi incorporando dos anos 70 para cá jovens de espaços populares foi o objeto da tese de doutorado da pesquisadora. O trabalho "Desigualdade numa escola em mudança: trajetórias e embates na escolarização pública de jovens pobres" foi defendido no primeiro semestre de 2006.

A partir da análise dos históricos escolares dos estudantes Mônica Peregrino pôde constatar, por exemplo, que a universalização do ensino chamado fundamental – de 5ª a 8ª série – foi acompanhada de uma segregação em turnos e turmas dentro da escola. E que, para além disso, a distribuição dos recursos da escola, humanos ou não, também é feita de maneira desigual. Os alunos moradores da favela, que tem pais em profissões mais precárias, com menos garantias e rentabilidade, e acumulam fracassos escolares estão geralmente nas últimas turmas.

“Isso significa que se eu sou um aluno de condição já vulnerável socialmente entro na escola e vou ocupar pelos critérios de segregação as piores turmas da escola. Essas piores turmas ainda por cima ocupam os piores espaços, tem os piores professores e os piores níveis de enraizamento, então, é a escola que está me negando direitos iguais de aprender, não é só a sociedade que está me negando”, explica Mônica Peregrino.

O coordenador do Observatório Jovem Paulo Carrano também participou do seminário. Para ele, essa situação aprofundada pela escola tem conseqüências que refletem no futuro dos jovens. “Há uma desigualdade não só do acesso à escola, na verdade está se falando de uma desigualdade do acesso à vida adulta. Porque todo esse percurso vai fazer falta no momento da inserção no mercado de trabalho, da construção de uma família, de selecionar bairros onde se vai morar em função do capital cultural e econômico”.

Para saber mais sobre a pesquisa, leia a entrevista feita com Mônica Peregrino:

Desigualdade numa escola em mudança

Observatório Jovem lança filme sobre ensino da historia afro-brasileira nas escolas

O filme Se eles soubessem... indaga jovens sobre suas experiências com o racismo presente na sociedade brasileira e apresenta as estratégias intergeracionais e coletivas produzidas para a superação desse tipo de preconceito a partir da escola

Observatório Jovem lança filme sobre ensino da história afro-brasileira nas escolas

O filme Se eles soubessem... indaga jovens sobre suas experiências com o racismo presente na sociedade brasileira e apresenta as estratégias intergeracionais e coletivas produzidas para a superação do racismo. Antes do lançamento do documentário, terá o debate Juventude, Escola e Desigualdades

O Observatório Jovem do Rio de Janeiro/UFF lança no dia 11 de dezembro o documentário “Se Eles Soubessem...”. O filme fala sobre a experiência do Colégio Estadual Guadalajara no trabalho com africanidades e os desafios da implementação da lei 10.639, que torna obrigatória a inclusão da História e Cultura Afro – Brasileira nos currículos oficiais do Ensino Fundamental e do Ensino Médio. O documentário foi feito em parceria com o Observatório da Juventude e o Programa de Ações Afirmativas, ambos da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e financiado pelo edital Uniafro do Ministério da Educação.
 
O lançamento do documentário será às 18h, na sala Paulo Freire (318), bloco D, Campus do Gragoatá da Universidade Federal Fluminense, em Niterói. A exibição do vídeo será acompanhada de um debate. A professora do Programa de Educação Sobre o Negro na Sociedade Brasileira (Penesb/UFF) Iolanda de Oliveira, coordenadora editorial do programa Salto Para o Futuro da TVE Brasil Bárbara Pereira, um representante do Núcleo de Cultura do Colégio Estadual Guadalajara e a pesquisadora do Observatório Jovem Mônica Sacramento participarão do debate.
 
Antes do lançamento do documentário, terá início às 14:30h o debate Juventude, Escola e Desigualdades  também na sala Paulo Freire, com a participação da professora da Universidade de São Paulo (USP) Marília Sposito, a professora da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) Mônica Peregrino e o coordenador do Observatório Jovem do Rio de Janeiro/UFF Paulo Carrano.
 
 
Sinopse do Se Eles Soubessem... 

O vídeo-documentário acompanha as experiências de educadoras e alunos/as do ensino médio do Núcleo de Cultura do Guadá, em atividade há 10 anos no Colégio Estadual Guadalajara, localizado em Duque de Caxias, Rio de Janeiro.
 
A produção se alia aos esforços de fortalecimento do campo de debates e formação dos/as educadores/as em torno da aplicação da Lei 10.639 que institui o ensino da História e cultura da África e das diversas contribuições e lutas dos afro-brasileiros/as, nos currículos escolares.
 
 O filme indaga jovens sobre suas experiências com o racismo presente na sociedade brasileira e apresenta as estratégias intergeracionais e coletivas produzidas a partir de suas participações no Núcleo de Cultura para a superação do racismo, que passam pela identidade racial e social, pela ressignificação do território escolar e pela construção de novos projetos de vida.

Veja o trailer em http://www.youtube.com/watch?v=fy-X0k7fZj4
 
Debatedores do filme
 
Iolanda de Oliveira: mestre em Educação pela Universidade Federal Fluminense e doutorado em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano pela Universidade de São Paulo (USP). Tem como objetos de pesquisa principalmente os temas: raça, desigualdade, criança e jovem.
 
Bárbara Pereira: apresentadora e coordenadora editorial do Programa Salto para o Futuro da TVE Brasil

Mônica Sacramento: mestre em Educação pela Universidade Federal Fluminense, pesquisadora do Observatório Jovem/UFF e do Programa de Educação Sobre o Negro na Sociedade Brasileira (Penesb/UFF).  Autora da dissertação “O impacto da política de cotas na ESDI" sobre a política de ação afirmativa adotada pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), especificamente a Escola Superior de Desenho Industrial. Mônica também é docente do curso de extensão do Penesb "A Questão Racial na Educação Brasileira".
 
 
Debatedores sobre Juventude, Escola e Desigualdades
Marília Sposito: doutora em Educação pela Universidade de São Paulo (USP), pós-doutora pela École des Hautes Etudes en Sciences Sociales, pós-doutora pela Universidad Complutense de Madrid e pelo Institut Nacional de Recherges Pedagogiques. Professora titular da USP e membro da diretoria da ong Ação Educativa.

Mônica Peregrino:doutora em Educação pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Professora assistente da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) e da Universidade Estácio de Sá. Tem como interesse de pesquisa, principalmente os temas: juventude, exclusão social e processos de escolarização.

Paulo Carrano: doutor em Educação pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Bolsista de produtividade do CNPq e coordenador do Curso de Pós-Graduação em Educação da UFF. Tem como interesse de pesquisa, principalmente os temas: jovens, cidades e educação, identidades e culturas juvenis e escola. É também coordenador do Observatório Jovem do Rio de Janeiro.

Redução da maioridade penal

A reportagem mostra a opinião de Ana Karina Brenner, do Observatório Jovem, do juiz da 37ª Vara Criminal do RJ Geraldo Prado, e de Raquel Willadino, do Observatório de Favelas sobre a diminuição da responsabilidade penal no Brasil

Foto: Ratão Diniz - Imagens do Povo - Escola de Fotógrafos Populares do Observatório de Favelas do Rio de Janeiro

Proposta que reduz a idade penal de 18 para 16 anos entra em pauta toda vez que um jovem pobre comete um ato infracional contra alguém da classe média

No boletim eletrônico do Observatório de Favelas do dia 9 de agosto foi lançada a enquête “você é a favor ou contra a redução da maioridade penal no Brasil?”. O resultado foi equilibrado - cerca de 53% se posicionaram contra e 47% a favor – mostrando que o abismo social e a sensação de insegurança que toma conta das grandes cidades acabam provocando o enrijecimento da opinião pública em relação às políticas de segurança.

A discussão sobre a redução da maioridade veio à tona recentemente com o assassinato do guitarrista da banda Detonautas, no último dia 4 de junho. Rodrigo Netto foi morto em uma  tentativa de assalto no Rocha, zona norte do Rio. Um dos suspeitos do crime tem 16 anos e está detido no Instituto Padre Severino. Na ocasião o jovem negou à juíza Adriana Angeli, da 2º Vara da Infância e da Juventude, que disparou contra o músico. Entretanto, em entrevista ao jornal O Globo, em 21 de junho, confessou que matou Rodrigo contando com riqueza de detalhes como aconteceu o crime. A contradição que cercou a confissão do jovem suspeito acabou favorecendo o debate. Para a psicóloga e mestre em educação, Ana Karina Brenner, do Observatório Jovem da UFF, trata-se de uma luta de classes. “Toda vez que um adolescente pobre comete um crime contra alguém da classe média se discute a redução da maioridade penal”, ressalta. O mesmo aconteceu em 2003, quando a estudante Gabriela Prado Maia foi morta durante um assalto na estação de metrô São Francisco Xavier, na Tijuca. Os criminosos não eram menores de idade, mas reincidentes do sistema penal.

O ECA

Impossível discutir redução da maioridade sem nos remetermos ao ECA. Criado em 1990, o Estatuto da Criança e do Adolescente institui a responsabilidade penal a partir dos 18 anos. Ana Karina afirma que este marco foi estipulado por critérios políticos que se articulam a um processo de maturação neurológica e psicológica que depende muito do ambiente social onde se vive. “Antes disso, os adolescentes têm dificuldade de entender a irreversibilidade dos seus atos”, analisa. Entretanto, a psicóloga pontua que podemos explicar o comportamento dos adolescentes, mas não justificá-los. “Se ele comete um ato infracional deve responder por isso. E a resposta do próprio Estatuto é punitivo associado ao estabelecimento de um processo sócio-educativo”, esclarece. Segundo ela, as medidas contidas no ECA são a Prestação de Serviços à Comunidade, Liberdade Assistida, Semi-Liberdade, Internação Provisória e Internação. “O adolescente perde o seu direito de ir e vir”, acrescenta.

Antes do Estatuto, havia um código de menores onde estava definido que crianças abandonadas ou que cometiam atos infratores teriam que ter suas vidas transformadas pelo Estado. Todas eram recolhidas para uma mesma instituição, as Febem’s. O ECA surgiu para romper com isso, estipulando que toda criança e adolescente são iguais, independente da classe social. A proposta, porém, ainda não está bem compreendida pela sociedade, tampouco sendo aplicada como deveria. O que se vê nas atuais unidades de internação é que as medidas sócio-educativas voltadas para os adolescentes infratores não estão sendo implementadas de acordo com o Estatuto. “Não podemos dizer que o Estatuto falhou na possibilidade de reduzir o índice de adolescentes infratores porque ainda não foi aplicado de acordo”, afirma Ana. “Por enquanto a sociedade é que fracassou na aplicação dos mecanismos estabelecidos”, finaliza. 

A Constituição

Entre os projetos que tramitam no Congresso Nacional está a proposta de emenda da constituição (PEC 26) de autoria do Senador Íris Rezende (PMDB/GO) que “altera o artigo 228 da Constituição Federal, para reduzir a idade prevista para a imputabilidade penal, nas condições que estabelece”. Contrário à redução, o juiz da 37ª Vara Criminal, Geraldo Prado, chama a atenção para os direitos fundamentais da criança e do adolescente. “Toda criança e todo adolescente tem os mesmos direitos fundamentais que os adultos e, além desses, outros especiais”, considera. Entre os direitos especiais garantidos na constituição para os adolescentes e as crianças, está o de não serem responsabilizados criminalmente antes dos 18 anos. “Independentemente do grau de conscientização ou maturidade de um adolescente, nós constituintes entendemos que a punição criminal é um castigo enorme para alguém nessa faixa etária, por mais grave que seja o ato que venha a praticar”, justifica. O magistrado ainda reforça que trata-se de uma cláusula pétrea, ou seja, regra que não admite retrocesso.

Do ponto de vista da luta de classes, Prado vai mais além. Para ele, o debate da redução da maioridade é um retorno disfarçado do autoritarismo que insiste em criminalizar adolescentes, especialmente os que moram nas favelas e periferias. “É todo um projeto de criminalização contra um grupo de pessoas que são ‘indesejáveis’ na sociedade”, discute. “Há mais negros dentro das cadeias do que nas universidades”, exemplifica.

Os direitos humanos

O debate da responsabilidade penal esbarra também na questão do sistema prisional. Pesquisas do censo penitenciário revelam que as unidades de internação têm índices de reincidência menores do que as prisões. Os dados não são precisos, mas em 1995/96, a Febem registrou cerca de 65% de reincidentes enquanto que nas penitenciárias o índice foi de 80%. Já em 2003, o índice caiu para 30%, chegando a 12% nas unidades mais próximas do perfil do ECA. Os números comprovam que o caminho é investir no sistema sócio-educativo, ao invés de superlotar as penitenciárias brasileiras.

 A doutora em psicologia social e coordenadora do Núcleo de Direitos Humanos do Observatório de Favelas, Raquel Willadino, aponta a ausência de reflexão sobre o sistema penitenciário neste debate. “Não podemos jogar os adolescentes dentro de um sistema que intensifica os problemas que o levaram para lá”, posiciona-se. Ela prevê que ao reduzirmos a idade penal, estaremos inserindo cada vez mais crianças nas atividades ilícitas. “Reduzir não trará nenhum benefício, a não ser um retrocesso no campo dos direitos”, enfatiza. “Temos que reorganizar o sistema em função do adolescente enquanto sujeito de direito”, sugere.
De acordo com Raquel, o movimento de direitos humanos se posiciona contra a redução da maioridade penal no Brasil. “Existe uma Frente Parlamentar que prioriza a discussão sobre criança e adolescente intervindo no Congresso Nacional em favor do ECA”, informa.

 *Karine Mueller é jornalista do Observatório de Favelas do Rio de Janeiro.

Sobre o assunto

Assista aos filmes:
Justiça, de Maria Augusta Ramos, Brasil (2004), documentário. 
Ônibus 174, de José Padilha, Brasil (2002), documentário.
Os incompreendidos, de François Truffaut, França (1959). 
Pixote – a lei do mais fraco, de Hector Babenco, Brasil (1981).
Como nascem os anjos, de Murillo Sales, Brasil (1996). 

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“A internet no diálogo entre universidade e sociedade”

No lançamento da nova página eletrônica do Observatório Jovem, pesquisadores falam sobre as experiências e possibilidades da internet na produção e divulgação de conhecimentos

O Observatório Jovem lançou no dia 18 de julho a nova página eletrônica e o documentário “Sementes da Memória”. Após a exibição e debate sobre o filme, foi realizada a mesa “A internet no diálogo entre universidade e sociedade”. O coordenador do Observatório Jovem, Paulo Carrano, Lívia Di Tommasi, da Rede de Juventude do Nordeste, e o representante do Centro Latino-Americano em Sexualidade e Direitos Humanos (Clam), João Francisco Lemos, conversaram sobre como a internet pode possibilitar a troca e socialização de conhecimentos e ainda atuar de forma a pôr em contato atores sociais.

 Paulo Carrano apresentou a trajetória da página do Observatório Jovem. Ele contou que no início era quase um blog no qual disponibilizava textos que eram solicitados. O projeto de mídia evoluiu para uma página eletrônica que acaba de ser reformulada com a utilização de um software livre. “Pensamos a página  como canal de escoamento da produção da universidade, mas ao mesmo tempo, um canal onde um novo conhecimento fosse gerado, a partir do encontro entre atores da universidade e dos movimentos sociais”, explica. 

Carrano fala também da experiência em lidar com tempos diferentes de produção – o da universidade, dos agentes sociais e dos agentes de políticas públicas.  “As pesquisas duram cerca de dois, três anos. Mas a universidade não pode abrir mão dessa lentidão necessária para  produzir um conhecimento mais maduro. A página do Observatório é canal  desse conhecimento lento, da informação mais rápida da notícia jornalística e do tempo ainda mais veloz dos movimentos sociais. É a síntese dos três tempos”, comenta.

Ele explica ainda que atualmente a vocação principal da página é estabelecer diálogo com os diversos pesquisadores da juventude que atuam em diferentes partes do país e dar visibilidade às produções – textos, teses, dissertações e relatórios – desses atores acadêmicos. “A página está aberta, é uma construção coletiva e deve ser utilizada por todo mundo que queira contribuir para isso”.

Lívia Di Tommasi contou a experiência com listas de discussão na internet. A Rede de Juventude da qual participa tem uma lista própria que atua de forma a organizar o movimento da rede. Uma outra lista de discussão – Construindo Teias – é responsável por debater temas e sistematizar ações. A última, de acordo com Lívia, é bastante diversa e reúne atores juvenis com características diferentes, como a juventude dos partidos políticos, ongs, movimentos de hip hop e outros grupos.

Apesar de apostar na necessidade da internet para organizar movimentos que extrapolem o local, principalmente em um espaço geográfico de grandes proporções como o brasileiro, a pesquisadora vê a necessidade de encontros presenciais. “Se não há esses momentos, as listas se perdem. É importante até mesmo para olhar no olho”, diz. 

Outra questão abordada por Lívia Di Tommasi se refere à inclusão digital. “A internet é democrática, mas precisamos lembrar que por falta de acesso físico ou hábito, às vezes, não funciona. No nordeste, os jovens não têm tanto acesso à rede, a universidade é um dos únicos espaços que garantem essa possibilidade”, alerta. 

A pesquisadora cita também a necessidade de qualificação das discussões que ocorrem nas listas e a dificuldade da organização para que o movimento seja propositivo e não apenas de oposição a políticas diversas.

Para Lívia, os movimentos de jovens não podem ser  taxados como fracassados ou de sucesso, visíveis ou não. “A juventude tem tempos diferentes, se organizam em grupos pequenos e invisíveis na maioria das vezes”, detalha. Ela critica a tentativa de institucionalizar os grupos de jovens e afirma que a universidade deve ter um papel diferenciado nesse processo. “A universidade deve fazer a leitura desses pequenos mundos, sem a tentativa de homogeneizá-los”.

João Francisco Lemos contou um pouco da história do Clam. O Centro Latino-Americano em Sexualidade e Direitos Humanos, do Instituto de Medicina Social da Uerj, foi criado em 2002 com o objetivo de reunir e tornar públicos estudos relacionados aos temas que dão nome ao centro. Cinco países participam do Clam. A internet funciona como veículo entre os núcleos de estudo do Brasil, Argentina, Chile, Peru e Colômbia.

A idéia da página eletrônica, segundo João Francisco, é mesclar jornalismo com pesquisa científica de maneira simples e acessível. “Está na hora do saber sair da universidade”, aponta. No entanto, ele afirma também que uma grande preocupação é a de que o ato de tornar acessível não resulte em perda de conteúdo. “Queremos qualificar o olhar sobre esses assuntos”, completa.

 As novidades publicadas na página do Clam – estudos, pesquisas e notícias – chegam a 14 mil pessoas por meio de uma mala direta. A pedido do Ministério da Educação (MEC), o centro está se dedicando também à capacitação de professores pela internet com o curso Gênero e Diversidade na Escola.  “Só é possível produzir isso tudo quando você perde a postura da universidade de produzir conhecimento apenas para ser publicado ou para as bibliotecas”, conclui  João Francisco Lemos.

 A mesa A Internet no diálogo entre universidade e sociedade foi capaz de traduzir o próprio espírito que move o Observatório Jovem – a interação entre a produção de conhecimento acadêmico, a transmissão desse saber e os jovens ou pessoas  próximas à juventude. Nesse sentido, Paulo Carrano, João Francisco Lemos e Lívia De Tommasi representaram essas interfaces e tiveram a oportunidade de aprofundarem a rede de cooperação entre elas.

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