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De olho na mídia

De olho na mídia

Pelo Direito do Acesso à Cidade

Futebol na Estação Brás do Metrô, 1997 - Crédito: Ed ViggianiO Fórum de Entidades e Movimentos Juvenis da Região Metropolitana de Belo Horizonte (FEMJRMBH) irá promover, do dia 21 ao dia 23 de setembro, o seu primeiro seminário, que terá como tema o acesso das juventudes à cidade

O evento “Juventudes e o acesso à cidade: construindo direitos” tem como objetivo aprofundar a discussão sobre esse tema, concretizadas na questão do passe-livre e da violência contra os jovens. Além disso, pretende-se construir uma agenda comum junto aos participantes, bem como estratégias de mobilização e articulação dos movimentos e entidades a fim de fortalecer a luta por políticas públicas voltadas para a juventude

Para Juarez Dayrell, coordenador do Observatório da Juventude da UFMG e integrante do Fórum, a importância desse seminário é congregar os debates e esforços em torno de um conjunto bem delimitado de questões que mostra-se especialmente importante nos contextos nacional e local de construção de políticas públicas de juventude. Juarez explica que o acesso à cidade é um tema discutido, no evento, numa perspectiva ampla. “Entendemos a cidade como esfera pública em relação à qual devem ser garantidos os direitos de ir e vir, de manifestação livre de idéias e produções culturais e artísticas, de participação ativa no debate político e nos espaços de encontro e socialização”, afirma.

Ao longo do Seminário, os representantes dos movimentos e entidades serão convidados a refletir sobre as lutas pelo passe-livre, violência policial e a questão da maioridade penal, em palestras e debates com especialistas e integrantes de iniciativas desse campo. De acordo com Rafaela Lima, coordenadora da ONG Associação Imagem Comunitária e integrante do FEMJ-RMB, “a idéia é sair do plano das discussões genéricas, uma vez que o universo de questões e demandas relacionadas à juventude é muito amplo, e estabelecer um conjunto de questões prioritárias frente às quais seja possível construir propostas efetivas”.

O Fórum de Entidades e Movimentos Juvenis da Região Metropolitana de BH surgiu a partir da realização do 2° Seminário de Políticas Públicas para Juventude, em setembro de 2004, organizado por entidades ligadas aos segmentos juvenis da cidade. Desde então, o Fórum tem se consolidado como um espaço de discussão e acompanhamentos das políticas públicas direcionadas aos jovens da região metropolitana, articulando ações comuns entre os grupos e movimentos, bem como estabelecendo interlocuções com o poder público local e ao Fórum Nacional de Movimentos e Organizações Juvenis. O Fórum, que se reúne regularmente, envolve 42 entidades e movimentos juvenis e promove ações de formação e mobilização, contribuindo assim para dar visibilidade social às demandas dos jovens e estimular o poder local a desenvolver políticas nesse âmbito.

O seminário “Juventudes e o acesso à cidade: construindo direitos”, irá acontecer do dia 21 ao dia 23 de setembro, na Escola Sindical 7 de Outubro, em Belo Horizonte. Como o número de participantes é limitado, cada entidade ou grupo poderá inscrever no máximo dois integrantes, garantindo assim a diversidade de olhares e representatividade dos coletivos e movimentos. As inscrições custam R$ 10,00, valor que será investido na infra-estrutura do evento, e podem ser feitas até o dia 14/09 pelo telefone, de 14:00 às 18:00h. Os interessados também poderão enviar a ficha de inscrição pelo e-mail forumdajuventude@yahoo.com.br. A taxa será recolhida no momento do credenciamento.

Seminário “Juventudes e o acesso à cidade: construindo direitos”
Data: 21 a 23 de setembro
Local: Escola Sindical 7 de outubro
Rua Nascimento, nº 107, no Barreiro de Cima
Belo Horizonte - MG

Mais informações
Danúbia ou Thiago – (31) 3499-5325
forumdajuventude@yahoo.com.br

Publicado originalmente no Boletim Informativo Rede Jovem de CIdadania de 23 de agosto de 2007 - Ano 04 #18

Comunicação Comunitária na América Latina

A Agência de Notícias conversou sobre a Comunicação Comunitária na América Latina com Carlos Guimarães, coordenador da área de Comunicação e Educação para o Desenvolvimendo da ONG Batá (Centro de Iniciativas para la Cooperacíon), entidade espanhola que desenvolve projetos relacionados ao desenvolvimento sócio-cultural de países do Terceiro Mundo, e professor do Master em Comunicación y Desarrollo Local da Universidad de Sevilla (Espanha)

Agência de Notícias: O que você entende por comunicação comunitária?

Carlos Guimarães: Qualquer adjetivo vinculado à comunicação corre o risco de limitar a sua definição por critérios quase que ideológicos. Pode-se pensar em comunicação comunitária relacionada à comunicação popular, vinculada a uma vertente de esquerda, mas também como sendo parte do desenvolvimento integral de uma determinada comunidade. Para nós, da Batá, o mais importante quando definimos “comunicação comunitária” é a questão do acesso aos meios de comunicação por grupos sociais excluídos dos meios de comunicação de massa. Ela é uma comunicação que permite a horizontalidade na relação entre emissor e receptor, mas, sobretudo, entre interlocutores.

A comunicação comunitária significa o empoderamento, a governabilidade e fortalecimento das redes sociais, do protagonismo e da cidadania. Também é um fator de desenvolvimento, uma vez que gera uma dinâmica de discussão e de mobilização social. Além de permitir a preservação da diversidade cultural, possibilita a identificação e a proximidade da população que usa diferentes suportes comunicacionais com o discurso que se emite. No entanto, para que isso seja possível é preciso que se preserve uma orientação metodológica que valorize a interlocução mais do que a simples dinâmica de emissão e recepção.

Agência de Notícias: Quais as características das primeiras experiências de comunicação comunitária na América Latina?

Carlos Guimarães: Para entender as características das primeiras experiências de comunicação comunitária na América Latina, é preciso entender um pouco da história que se passou por trás disso. Entre as décadas de 60 e 70, nós estávamos vivendo uma época de guerra fria, de ditadura, de conflito entre o comunismo e o capitalismo. Na comunicação comunitária, conviviam essas duas visões: uma muito capitalista, da FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação), dos EUA, que criou rádios para transmitir algum tipo de conhecimento como apoio a projetos de cooperação; e outro movimento mais clandestino, de esquerda, mas também muito dirigistista, muito pouco vinculado às bases. Essa realidade foi sendo transformada durante as décadas de 70 e 80, com a formação de um forte movimento popular, que tinha por trás a Igreja Católica na grande maioria dos países onde aconteceu. A Teologia da Libertação funciona, nessa época, como um catalisador e uma espécie de canteiro dos movimentos sociais, que também usavam veículos de comunicação. No Brasil, por exemplo, o Jornal São Paulo, da diocese de São Paulo, foi um veículo importante para os movimentos sindicais e sociais nesse período.

Na década de 80, as pessoas treinadas pela FAO vão percebendo o poder dos meios de comunicação e passam a interpretar a relação emissor / receptor de outra maneira, mais voltada para a interlocução. Além disso, com o descrédito da esquerda, a cooperação internacional e os movimentos sociais passaram a se apropriar desses meios a partir de agendas diferentes, que não eram baseadas nem em ideologias globais contra o imperialismo, nem em agendas de desenvolvimento puro, visto pelo lado econômico. Propuseram agendas sociais setoriais, assumindo os meios de comunicação para veicular as suas mensagens de movimentos de mulheres, indígenas, de negros, de camponeses. E, a partir do final dos anos 80, essa vai sendo a tendência da comunicação comunitária: a fragmentação por setores de interesse.

Agência de Notícias: E para você, o que mudou dessas experiências iniciais para as que existem atualmente?

Carlos Guimarães: Existe hoje uma recuperação ideológica, não ao estilo do velho comunismo e da velha esquerda, mas uma reivindicação ideológica que parte da base social dos movimentos, e não dos partidos políticos. E que permite discutir, formar fóruns de debates e redes. Pra mim é isso representa um grande avanço em termos de políticas de comunicação popular. Além disso, a apropriação da internet por esses movimentos também é um grande avanço, uma vez que permite conectar temas que aparentemente estavam desconectados.

Atualmente, existe, por exemplo, a Liga dos Movimentos Socais, que funciona como uma espécie de grande portal dos movimentos sociais da América Latina na web. O portal coordena uma série de ações de movimentos distintos: feminista, indígena, de negros, dos sem terra, dos sem teto, entre outros. Essa liga anualmente marca uma agenda de debates e mobilização. Sua atuação tem tido um impacto significativo e provocado outros atores da sociedade. Um claro exemplo disso foi o fato de que, no ano passado, o Banco Mundial e outras organizações assumiram como parte importante dos programas de ajuste estrutural as políticas de comunicação social. Essas entidades realizaram em Roma, em 2006, o primeiro Encontro de Comunicação e Desenvolvimento em nível global, com seções preparatórias em todos os continentes. Tais seções, ao invés de terem sido organizadas por técnicos do Banco Mundial, ficaram a cargo de pessoas representativas dos movimentos de comunicação comunitária de cada um dos continentes.

Eu acredito, que hoje em dia, o grande motor da coordenação da comunicação comunitária na América Latina, em questões macro, que permite posicionar frente ao movimento da globalização, é a Internet. No nível micro, de inserção social, continuam sendo os mesmos suportes tradicionais, como rádios, tvs locais, com uma grande limitação ainda do que é a legislação do espaço de radiodifusão. Apesar disso, a luta caminha bem definida, tendo em vista que a comunicação passa a ser parte da agenda desses movimentos como defesa de um direito humano fundamental. Algo muito diferente do que acontecia antes, quando ela era somente uma ferramenta de transmissão de idéias. O grande avanço é que ela é uma questão que passa a ser parte da agenda de quase todos os movimentos sociais, como a defesa de um direito fundamental.

Agência de Notícias: Como você enxerga as legislações que regulamentam a comunicação comunitária da América Latina?

Carlos Guimarães: Eu diria, como disse Ignacio Ramonet (presidente do Le Monde Diplomatique), que é bastante fácil explicar porque existe uma limitação tão grande nas legislações de acesso a comunicação: é que antes nós pensávamos na democracia erguida sobre três poderes: legislativo, executivo e judiciário. Mas existe um quarto poder na democracia neo-liberal globalizada, que são os meios de comunicação. Antes ele era uma espécie de contra-poder, uma espécie de contra-peso aos outros poderes, mas hoje os meios de comunicação são uma parte importante na emissão dos sentidos do que é a globalização, na criação de uma espécie de inconsciente coletivo sobre o que são as nossas metas e valores.

Assim, a comunicação dos grandes meios é parte do esquema da globalização, e por isso é tão importante controlar o acesso aos canais e as mensagens que são emitidas. E contra isso Ramonet propõe um quinto poder: um poder cidadão, que deve fazer uso de absolutamente todas as ferramentas que estejam ao seu alcance para controlar os outros quatro, incluindo os meios de comunicação. Para ele, a grande luta hoje é a da construção dessa cidadania ativa, que atenda não só aos direitos humanos naturais, reconhecidos pela Declaração Internacional dos Direitos Humanos, mas um dos mais importantes, o da comunicação.

Por muito tempo se apregoou que os meios existentes eram porta-vozes da sociedade civil. O que estamos vendo hoje é que eles são porta-vozes de interesses vinculados à globalização. Faz-se fundamental, portanto, lutarmos para que as legislações ligadas à comunicação determinem com bastante clareza espaços e meios que estejam efetivamente a serviço do público, bem como formas e mecanismos de acesso de toda a população aos meios de comunicação. O gigantismo das grandes redes de comunicação é um fator inibidor da partição popular nos veículos de comunicação. Portanto, as legislações devem ser meios que possibilitem essa proximidade, a existência de meios comunitários que estejam o mais próximos possíveis da população com a qual se pretende comunicar.

Agência de Notícias: Em toda a América Latina existem iniciativas e estudos voltados para a relação entre a comunicação e a educação. Como você enxerga essa relação e qual a importância de experiências nesse campo?

Carlos Guimarães: Existe uma espécie de confusão que parte do que cada um pensa do que é comunicação e educação. Se nós vamos ao pensamento de Paulo Freire ou de Mário Kaplún, não existe uma verdadeira comunicação educativa se a base dessa educação não é romper com o esquema emissor/ receptor que existe tanto na comunicação tradicional quanto na educação tradicional. A relação mestre/ aluno, que é uma relação muito vertical de poder que existe na escola tradicional, quando é transferida para a comunicação reproduz esses esquemas de poder e de submissão. Existe esse tipo de comunicação educativa, que utiliza os suportes comunicacionais para a transmissão de conhecimentos e valores, como uma espécie de educação nos modelos do Telecurso, da Rede Globo.

Vejo a relação entre comunicação e educação como fundamental, pois são processos inseparáveis. Não existe educação que não seja comunicação, e vice-versa. O problema é quando nós percebemos a comunicação a partir do fetiche tecnológico. Quando você entende a comunicação como algo que só se pode fazer através da mídia, você perde a dimensão educativa. A mídia possui formatos, discursos e tempos, e os processos educativos têm que estar isentos de qualquer formato prévio que os encarcerem. Se nós focamos a comunicação como um processo social de fato, e se nós a entendemos como as estratégias de diálogo que podemos utilizar, então não existe nenhuma dificuldade de pensar comunicação e educação como irmãs. Podemos utilizar os meios de comunicação como um processo educativo, mas para isso devemos sempre considerar o critério de “convivencialidade”, defendido por Ivanovich em algumas de suas obras. De acordo com esse critério, toda ferramenta de comunicação que nós utilizamos deve nascer de uma necessidade partida da própria comunidade. Essa ferramenta deve ser passível de transformação e apropriação por parte comunidade, além de promover o diálogo entre os seus integrantes. Além disso, é importante que, quando essa ferramenta desaparecer, não desapareça a dinâmica de comunicação e de educação que se estruturou através dela. Esse critério, para mim, é fundamental para identificar se nós estamos usando os meios de comunicação como o verdadeiro espírito de comunicação popular freiriano, ou não.

Quando você se insere em um processo social de transformação e debate, esse movimento ou essa comunidade começa a detectar as necessidades comunicacionais que tem e se apropria naturalmente dos suportes que respondem a essas necessidades. Embora exista a necessidade desse processo ser acompanhado por profissionais que irão ajudar a polir o discurso e a prepará-lo, dependendo se esse discurso vai para dentro ou para fora do movimento, o mais importante é que nunca se imponha determinado suporte, nunca se imponha a um grupo uma ferramenta que necessite de uma prévia formação desse grupo nesse suporte, e não uma apropriação interessada. Quer dizer: eu posso dar um curso de vídeo, dar um curso de manejo da câmera e as pessoas aprenderem exatamente a usar, mas a câmera vai estar vazia de discurso. O grande processo de comunicação começa no debate.

Publicado originalmente no Boletim Informativo Rede Jovem de Cidadania 23 de agosto de 2007 - Ano 04 #18

Jovens mulheres abandonam o leste da Alemanha

21 de julho de 2007

Para Saskia Recknagel, 17 anos, que está cursando a penúltima série do Segundo Grau no liceu Am Lindenberg, em Ilm, região da Thuringe (na ex-Alemanha Oriental, RDA), "mudar-se para outro lugar constitui uma verdadeira opção". Assim como ela, muitas são as colegiais que procuram por melhores perspectivas de empregos e, para tanto, prevêem deixar a região. Desde a queda do regime comunista e do desmoronamento da economia, a região da Alemanha Oriental perdeu mais de 1,5 milhão de habitantes, particularmente os mais qualificados

As jovens mulheres partiram em massa, causando um desequilíbrio entre os sexos único na Europa. Atualmente, grande parte das regiões da ex-Alemanha Oriental apresenta um déficit feminino de pelo menos 15% entre as pessoas que têm menos de 30 anos. Na circunscrição de Ilm, a desproporção alcança níveis extremos, uma vez que foram recenseadas 78 mulheres para 100 homens na faixa de idade situada entre 18 e 29 anos.

Nas ruas de Arnstadt, a principal cidade do distrito, a ausência de jovens mulheres não é tão evidente assim. Na praça do mercado, na parte antiga da cidade, as mais visíveis são as pessoas idosas. "Não é um fenômeno que chama a atenção no dia-a-dia", explica Sebastian Lenk, o porta-voz da circunscrição. Mas é durante a noite, "ao sair para curtir nos bares e nas boates, que você percebe que a presença feminina diminuiu", acrescenta.

Reuniões de extrema-direita
Ora, este déficit feminino tem repercussões visíveis no comportamento dos eleitores. Os pesquisadores do Instituto de Demografia de Berlim constataram que a extrema-direita não raro está implantada nos lugares onde as mulheres estão em falta.

Embora o NPD (Partido Nacional-Democrata da Alemanha, fundado em 1964 por antigos militantes nazistas) esteja longe de obter em Ilm os resultados que ele consegue em certos distritos da Saxônia ou do Mecklembourg-Pomerânia Ocidental, a situação pode mudar.


POPULAÇÃO
Entre 1991 e 2005, cerca de 400.000 mulheres com menos de 30 anos, contra 273.000 homens deixaram a Alemanha Oriental. A baixa população feminina alcança um nível recorde em Thuringe, com uma média de 82 mulheres para 100 homens entre as pessoas com idade de 25 a 29 anos. A circunscrição de Ilm conta 115.753 habitantes.

GRAU DE ESTUDO
Entre 1999 e 2004, 30,9% das colegiais se tornaram titulares do diploma geral de conclusão dos estudos do Segundo Grau, contra 20,8% dos rapazes na Alemanha Oriental. Entre 1999 e 2004, 26,1% das colegiais, contra 20,3% dos rapazes, haviam obtido o diploma de conclusão dos estudos na Alemanha Ocidental.

EMPREGO
Na circunscrição de Ilm, a taxa de desemprego alcança 15,3%, entre os menores de 25 anos; 11% dos homens e 6% das mulheres estão procurando um emprego.


"As reuniões dos jovens de extrema-direita tendem a ser mais freqüentes e a mobilizar um maior número de simpatizantes", afirma Martina Lang, uma eleita social-democrata da cidade de Arnstadt e diretora da agência local para o emprego.

O sucesso escolar das jovens costuma ser mencionado para explicar essas migrações femininas. Este fenômeno, que é comum em toda a Alemanha, é particularmente flagrante no Leste. As jovens costumam obter notas muito melhores logo do Primeiro Grau, e são mais numerosas a serem titulares de um diploma de conclusão dos estudos do Segundo Grau.

Esta situação se reflete no mercado de trabalho. As estatísticas da agência para o emprego de Arnstadt mostram que o desemprego atinge muito mais os homens do que as mulheres. "Os homens são preguiçosos, eles preferem ficar aqui em vez de tentarem procurar por um trabalho numa outra região", afirma Martina Lang.

As mulheres enviam um maior número de candidaturas, participam com maior freqüência de estágios de formação. "Elas são flexíveis e não hesitam a partir caso elas não consigam encontrar um emprego", resume Martina Lang. Esta é sem dúvida a opção que escolherá Lydia Leide, uma estudante em economia dos meios de comunicação na Universidade de Ilmenau. "A Thuringe oferece muito poucos empregos no meu setor; eu talvez não tenha outra alternativa a não ser instalar-me em outro lugar", explica esta morena alta de 21 anos.

Este comportamento é em parte uma herança da antiga RDA. "Na época do regime comunista, a maioria das mulheres era obrigada a trabalhar; esta mentalidade impregna até hoje as jovens mulheres", sublinha a diretora da agência de emprego. A idéia, ainda muito dominante no Oeste, de encontrar um marido que faça viver toda a família permanece alheia às preocupações das jovens estudantes do Leste. "Está fora de cogitação que eu renuncie a trabalhar", confirma Saskia Recknagel.

A outra explicação apresentada pela administração do Ilm-Kreis sustenta que é reduzida a proporção de empregos "femininos". "Nós temos muitas empresas no setor da construção mecânica, na construção civil e nos transportes", explica Sebastien Lenk.

Além disso, a universidade técnica de Ilmenau está orientada, sobretudo, para a formação dos futuros engenheiros. As estudantes representam 28% do número total de alunos, enquanto a sua proporção diminui até mesmo para 10% nas carreiras as mais técnicas.

Para tentar segurar as jovens mulheres na região e incitá-las a se voltarem em maior número para profissões consideradas como "masculinas", a universidade técnica organiza todo ano reuniões de informação nos colégios da circunscrição. Mas os organizadores desta iniciativa não nutrem nenhuma ilusão em relação aos efeitos dos seus esforços: "É uma gota de água no oceano", dizem.

Tradução: Jean-Yves de Neufville

Visite o site do Le Monde

Fonte: Uol Mídia Global

Atividades culturais têm influência positiva sobre jovens de instituição

No Circo Baixada, jovens aprendem artes circenses e cidadania Jornal, rádio, sites e até o circo podem ser um divisor de águas na formação de adolescentes de baixa renda. Em visita a instituições da Baixada,    Ana Enne, da UFF, viu que jovens que integram atividades culturais são articulados e têm perspectivas. Sem isso, resta o desalento

Segundo Ana Enne, cada vez mais as ONGs se voltam para atividades artísticas e culturaisAtividades culturais podem ser um grande divisor de águas na formação de adolescentes de baixa renda. A constatação é do grupo de pesquisa que se enfronhou por instituições da Baixada Fluminense e descobriu um mundo de diferenças entre os jovens que aprenderam a lidar com os vários recursos da mídia, fazem jornal, programas de rádio e sites, e os que estão em instituições onde não têm acesso a nada disso. Da maior sofisticação de vocabulário e formas de expressão verbal dos primeiros ao desalento e falta de perspectiva dos segundos, esse contraste pode ser traduzido pelas respostas de dois jovens. Enquanto um deles vê a possibilidade de continuar trabalhando com instrumentos de mídia no futuro, outra apenas responde: "Quando crescer, quero ser soldado do Bope, para ter autoridade e poder subir o morro dando porrada em todo mundo."

"As instituições, especialmente as ONGs, estão cada vez mais voltadas para atividades culturais. É uma categoria chave nesse processo de intervenção com os jovens", explica a pesquisadora Ana Lúcia Enne, do Programa de Pós-Graduação em Comunicação, da Universidade Federal Fluminense (UFF), e do Laboratório de Mídia e Identidade (Lami). Com os professores Antonio Carlos de Souza Lima (proponente) e Adriana Vianna, ambos do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social (PPGAS) do Museu Nacional/UFRJ e do Laboratório de Pesquisas em Etnicidade, Cultura e Desenvolvimento (Laced); e Marialva Barbosa, do Programa de Pós-Graduação em Comunicação, da UFF, e do Laboratório de Mídia e Identidade (Lami), ela desenvolveu, com apoio do edital Direitos Humanos da FAPERJ, a pesquisa Adolescentes e práticas institucionais na Baixada Fluminense - arenas de disputa pelo direito de significar.

Embora a proposta inicial fosse Adolescentes infratores e práticas de confinamento, arena de disputas pelo direito de significar, a equipe logo percebeu que havia iniciativas bastante interessantes, trabalhando com recursos de mídia e tecnologia, ou atividades circenses, a partir da perspectiva do protagonismo adolescente. "São eles que fazem o jornal, o programa de rádio, montam o próprio site", fala. Tudo isso mudou o rumo da pesquisa, que acabou se estendendo e se transformando no atual trabalho. Isso também permitiu uma visão comparativa interessante entre as entidades que contam, e as que não contam, com atividades, como oficinas de teatro, percussão, música ou as artes do picadeiro, entre diversas outras, para ocupar os jovens no período em que não estão na escola. E ainda gerou mais um fruto. "Como vimos que as próprias instituições desconhecem o que as outras fazem, resolvemos criar uma rede (site) para unir os vários trabalhos. Isso se torna útil até para quem faz pesquisa", diz. Uma versão preliminar da Rede Jovem da Baixada Fluminense pode ser visitada no endereço http://www.uff.br/lami.

Além do site da Rede Jovem da Baixada Fluminense, que está sendo desenvolvido, a equipe  pretende apresentar os resultados finais da pesquisa das seguintes formas: em uma coletânea, em fase de edição, "O direito à representação: discussões sobre mídia, adolescentes e políticas públicas", com artigos dos pesquisadores participantes; em um relatório completo que será disponibilizado para download no site da rede até o fim de 2007; e em um seminário interinstitucional sobre o tema "Mídia e Baixada Fluminense".

A equipe escolheu trabalhar com adolescentes por se tratar de faixa etária e categoria social de enorme importância na contemporaneidade. É a fase de escolher os caminhos a seguir na vida adulta. E, seja pela questão do consumo, pela questão da violência ou pela própria idéia de identidade, é também uma fase que está bastante em evidência. "As instituições têm essa mesma visão e cada vez mais voltam seus trabalhos para eles", explica Ana. Focar a Baixada Fluminense teve também motivo: trata-se de uma região marcada por vários estigmas e problemas sociais graves. "Por tudo isso, acho que é papel da academia trabalhar a região", diz Ana Enne, que desde os tempos de mestrado vem fazendo pesquisas naqueles municípios.

Trabalho etnográfico com os jovens da Baixada

Na Casa de Cultura da Baixada, jovens integram atividades culturais e passam a ver possibilidades de mudança neles e no mundo a sua volta

As 12 instituições visitadas foram selecionadas a partir de uma lista preliminar, elaborada por critérios de visibilidade e alcance. A partir deste primeiro contato, foram delimitadas algumas para a realização de um trabalho etnográfico com os jovens. "Escolhemos quatro entidades, num processo gradativo de liberdade e recursos de expressão (da que tem mais à que tem menos liberdade) e partimos para um trabalho de campo com os adolescentes. Só houve autorização para entrevistas em instituições de confinamento femininas. Nas masculinas, isso ainda não foi permitido", diz.

"Muitas delas têm o programa Agente Jovem, do governo federal, que repassa recursos às prefeituras para selecionar jovens que receberão uma bolsa mensal (R$ 60) para participar de palestras e atividades no horário em que não estão na escola", explica a pesquisadora. Para traçar a etnografia local, foram entrevistados cerca de 50 jovens, em mais de 12 horas de gravação, e feitas cerca de 200 fotos.

Nas entrevistas, as diferenças nas falas foram gritantes. Nas várias instituições em que a mídia é instrumento de oficinas de fanzine, criação de vídeo, grafitti ou desenvolvimento de sites, percebeu-se que o fato de poderem atuar como sujeito muda a visão de mundo dos jovens, abrindo-lhes a perspectiva de transformação. "A primeira coisa que se percebe é que eles falam "nós, os Enraizados", "nós, do Cecip", "nós, do Circo Baixada", num discurso em que se assumem como parte da instituição. É visível a esperança, sua crença na possibilidade de mudança, tanto deles quanto do mundo ao redor. Até o vocabulário que usam é mais engajado; empregam naturalmente nas conversas palavras como transformação, ideologia, ativismo. Afinal, eles fazem parte de ONGs em que tudo isso está muito presente", explica.

Nas instituições de confinamento e naquelas em que não se trabalha com mídia, a perspectiva é outra. "O garoto fala de forma paternalista, esperando favores, que a entidade lhes conceda alguma coisa. Dizem "a gente queria…". E como só têm atividades pedagógicas ou no máximo assistenciais, sua conversa chama mais atenção para as faltas, não para as conquistas: é a falta de lazer, de liberdade de sair... Tudo se resume, na verdade, à falta de perspectiva presente e futura, a um enorme desalento. Quando se fala em sonhos, eles praticamente não respondem. Seu maior desejo é ter emprego no futuro", lamenta Ana.

Aliás, os pesquisadores perceberam que a pergunta sobre o que querem ser na vida adulta obedeceu o mesmo padrão. As profissões acadêmicas não têm apelo entre eles. Embora alguns apontem profissões clássicas, como médico e advogado, e um grupo reduzido responda "jogador de futebol e artista", o que parece ter maior apelo entre os adolescentes de entidades que não têm atividades culturais são as profissões do cotidiano, como mecânico, bombeiro hidráulico, motorista.

"Isso mostra como a realidade que vivenciam é forte e que eles só conseguem pensar no que há de concreto para eles, limitando até onde podem desejar chegar. E mostra ainda que a capacidade de sonhar entre eles está se esvaindo", lamenta. O que chamou mais atenção foi a jovem de uma instituição de confinamento que apontou como exemplo ser "soldado do Bope", evidenciando o quanto a realidade — e quanto mais dura pior — limita os sonhos.

Apesar dessas diferenças, há também semelhanças. "Todos eles, sem exceção, demonstram grande necessidade de falar e de ser escutado. As entrevistas foram longas, de mais de uma hora, e a filmadora com que gravamos as conversas teve um papel importantíssimo. Ao contrário do que seria de imaginar, e com raras exceções, diante da filmadora não houve timidez. Eles querem muito falar com a câmera, ficam mais eloqüentes. Quando a entrevista não era gravada, eles falavam menos, se entediavam", surpreendeu-se. Ana acredita que isso aconteça não apenas pela idéia de glamurização de se ver na tela, mas principalmente pela noção de multiplicação daquela fala. "O que me faz pensar que a questão da visibilidade é ainda mais importante", diz.

A mídia e seus instrumentos é o que universaliza todos eles. "Todos vêem os mesmos programas de TV, gostam filmes de terror, amam música, adoram internet - os jovens confinados têm o maior desejo de usar, queriam que tivesse computador na instituição onde estão", enumera Ana. "À pergunta 'se tivesse dinheiro, o que faria?', a resposta mais freqüente é 'comprar um MP3 player'. Principalmente entre as meninas do confinamento, porque têm gostos musicais diferentes e são obrigadas a escutar o mesmo rádio, tendo que revezar a estação e não podendo escutar a sua preferida na hora desejada".

Shopping, computador e MP3

Os jovens do Cecip olham o site que criaram

Na questão do consumo, por sinal, nenhum deles difere em preferências de qualquer outro jovem, independente de classe social, situação financeira ou a realidade que vivenciam. Todos têm paixão em consumir. "Mesmo os que não têm casa, nem frequentam escola, amam ir a shopping, querem roupas e tênis de marca, ter acesso a MP3 e computador. Isso aparece direto nas falas", diz. Numa das instituições visitadas, a ABCD, os meninos do programa Agente Jovem, que em geral dividem o dinheiro da bolsa com a família (alguns o repassam todo às famílias), gastam tudo o que fica com eles em roupas. Numa instituição de confinamento, uma das meninas disse que gastaria todo o dinheiro que tivesse para comprar um tênis All Star. "Quanto menor a possibilidade de consumo e de visão crítica, mais eles querem gastar, o que mostra bem como é forte o bombardeio da mídia", explica.

Entre as ONGs, essa fala consumista diminui e entra uma visão crítica ao consumo e à mídia. Uma das meninas da ONG Enraizados - que mantém reuniões semanais do projeto chamado Centro de Estudos de Formação de Ativismo e Militância (Cefam), sobre cidadania, ética etc. - chamou atenção para a mensagem subliminar de uma propaganda de TV. "Um anúncio de automóvel com bichinhos, em que um deles diz que quem não pode comprar carro é bicho... Por aí, se vê o grau de percepção que esses meninos desenvolvem", elogia.

Sobre o papel da escola, foram comuns as reclamações quanto à falta de equipamentos, desde os mais corriqueiros, como pratos e material didático, até TV, DVD, e, claro, computador. "Muitos disseram que havia, mas foram roubados. Falam também da falta de atividades culturais e lúdicas. A única de que dispõem são as aulas de educação física. Só há atividades nas ONGs. Além disso, nas escolas, os trabalhos são predominantemente escritos, uma imposição do letramento sobre a cultura da oralidade, que é a que eles sabem manusear", esclarece. Outra queixa geral foi a ausência de alguém que escute seus problemas. As relações com a direção e os professores é imediatista, burocrática. O que os leva a enxergar nas ONGs essa possibilidade de escuta.

Também é presente a questão da discriminação. Afinal, muitos são negros e se sentem perseguidos, seja nos supermercados, shoppings, praia, ônibus. Muitos relatam casos de constrangimento. "São acusados de roubo, constrangidos por seguranças, o que sempre é motivo de muita revolta. Foram os momentos em que demonstraram maior exasperação durante a entrevista, já que a situação gera uma raiva enorme", narra. Segundo Ana, um dos garotos chegou a processar, junto com a mãe, um supermercado, onde o acusaram de roubar um vidro de maionese. Inteligente e articulado, X quer ser médico, e não deixou passar a humilhação sofrida. O processo, no Juizado de Pequenas Causas, lhe deu ganho de causa. A maioria, porém, passa pela mesma situação e termina se calando, apesar da raiva.

"Esses meninos têm uma enorme necessidade de visibilidade e expressão. A mídia desempenha papel fundamental nesse processo. As instituições tradicionais, como escola e família, demonstram que não sabem escutá-los. E as ONGs acabam tendo um papel muito importante nessas lacunas; quanto elas mais atuam, reforçando o direito à expressão, mais o efeito de esperança, transformação e formação crítica nesses garotos se torna visível", fala Ana.

Para Ana, é preciso que a escola passe a ocupar esse lugar, escutando e dando vazão às formas de expressão desses meninos e meninas. E principalmente fazendo uso dos instrumentos da tecnologia e da mídia. "Embora eles também critiquem a mídia pela visão negativa sobre a Baixada Fluminense, pelo estigma que sofrem por serem moradores de lá, que lhe reduz as chances de emprego e oportunidades, vimos o efeito que esses instrumentos têm; como os tornam mais desenvoltos e articulados", diz.

Veja a atividade de algumas dessas instituições pelos links:
Cecip - site Geração Digital - http://www.cecip.org.br/geracao/
Casa de Cultura da Baixada - http://www.casadaculturabaixada.org.br/
Enraizados - http://www.enraizados.com.br/Default2.asp
Circo Baixada - http://www.circobaixada.org/
Rede Jovem da Baixada Fluminense - http://www.uff.br/lami/redejovembaixada/redejovem.html

Publicado originalmente 09/08/2007 pelo BOLETIM DA FAPERJ (http://www.faperj.br/boletim_interna.phtml?obj_id=3866)

Primeiro longa-metragem do curso de Cinema da UFF é exibido no Cine Arte

Está em cartaz no Cine Arte UFF o primeiro filme de longa metragem universitário da história do cinema brasileiro, "Conceição - Autor bom é autor morto". O filme é uma co-produção do curso de Cinema da UFF, CTAv, Inventarte/Carcará filmes e Pecego Produções/Duas Mariola. A direção é de André Sampaio, Cynthia Sims, Daniel Caetano, Guilherme Sarmiento e Samantha Ribeiro

"Conceição - Autor bom é autor morto" é um filme sobre o que as pessoas querem ver no cinema. A trama central envolve o encontro de autores e suas idéias. Liderados pelo eterno Fugitivo (Augusto Madeira), perseguido por um implacável Caçador (Jards Macalé), as personagens revoltam-se contra seus irresponsáveis criadores.

O filme fica em cartaz até 9 de agosto (até o dia 2, às 21h; e de 3 a 9, às 19h20). O Cine Arte UFF fica na Reitoria da UFF, Rua Miguel de Frias, 9, Icaraí, Niterói.

--> Consulte a programação do Cine Arte.

Juventude, emprego e saúde republicana

Gazeta Mercantil (SP) – 30 de Julho de 2007

Quando do anúncio do chamado PAC da Segurança, o Ministro da Justiça, Tarso Genro, em entrevista à imprensa, sublinhou que existem no Brasil 4,5 milhões de jovens entre 18 e 19 anos em situação de risco social. Informou que a população carcerária dessa faixa etária vem crescendo em aproximadamente 25 mil novos detidos todos os anos

O crescimento incorpora a carceragem dos que cumpriram pena. Adicionalmente, o Ministério da Justiça estima que 70% dos jovens que cumpriram pena (aproximadamente 40 mil) reincidirão no crime.

Trocando em miúdos, todos os anos o Brasil está recolhendo aos presídios o equivalente a uma nova "divisão de infantaria" plenamente recrutada. Os mesmos presídios liberam 28 mil jovens, que retornam ao ilícito e ao crime. É conhecida a complementação deste cenário: o País teve mais de 55 mil brasileiros falecidos por causas violentas (bala, faca etc).

O leitor deve recordar que as baixas norte-americanas no Vietnã, em dez anos, não chegaram a esta mortandade. Deve saber que a principal causa de falecimento – na população entre 18 e 40 anos – é a violência e que morrem sete vezes mais homens jovens que mulheres. Nestas, para nossa inquietação, as principais causas estão ligadas a problemas de gravidez e parto.

A dimensão mais visível dessa tragédia é o medo progressivo que tem conduzido nossa classe média ao isolamento dos condomínios, ao esvaziamento das ruas e da vida noturna e o insulamento cada vez maior nas áreas dos centros comerciais (shoppings).

Enquanto isso, nossa população pobre, claramente desprotegida, é entregue à ditadura das quadrilhas de tráfico, que substituem a República nos territórios sob seu controle. Alternativamente, vem se desenvolvendo, como um poder paralelo ao Estado, as milícias, que cobram "taxa de proteção" dos moradores e substituem todas as atividades das quadrilhas, menos o tráfico de drogas, que erradicam da área onde atuam.

"Novas instituições" vêm surgindo, uma delas é a inovação "imobiliária", pela qual que milícia se apropria das casas de traficantes e seus amigos e as "comercializa".

A dimensão assustadora e que ameaça a República está nos 4,5 milhões de jovens desempregados e sem perspectiva de inserção produtiva social. É fácil compreender sua relutância em constituir família; vem se multiplicando vertiginosamente a família uniparental cuja titularidade cabe a uma mulher jovem, pobre, com um ou mais filhos de pais não assumidos.

Essa jovem mãe urbana e pobre forma o estrato mais vulnerável da força de trabalho; é o grande contingente de "serviço terceirizado", pessimamente remunerado. Para obter rendimento monetário tem que confiar a guarda e proteção de seus filhos a terceiros. Quando tem avós-pais, está melhor. Em sua ausência tem que remunerar uma "mãe crecheira".

Dada a insuficiência crônica do sistema de creche e precariedade da escola pública, esta criança se desenvolverá na cultura da rua de uma sociedade praguejada pelo desemprego. Está em desenvolvimento uma população desinformada da ética do trabalho e com referências familiares progressivamente evanescentes.

Genro elaborou uma proposta de R$ 1 bilhão para criar "alternativas" para esta juventude. Sem a geração de emprego, este é um gesto bem intencionado perfeitamente inócuo. O Brasil, sem um projeto de desenvolvimento e sem uma acelerada criação de oportunidades de trabalho e renda, estará colhendo safras cada vez mais numerosas de fatos violentos e verá a República em dissolução.

(Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 8)

Conjuve dialoga com ministérios e busca interferir na elaboração do PPA

Solenidade com o Presidente Lula no CONJUVE. Brasília, DF. 02/08/2005. Foto: Ricardo Stuckert/PRComissão de Políticas do Conselho Nacional de Juventude identifica necessidade da Secretaria Nacional da Juventude reforçar sua articulação junto aos ministérios e incidir na formulação de políticas

Conjuve dialoga com ministérios e busca interferir na elaboração do PPA

No Plano Plurianual – PPA 2008-2011, que está em fase de elaboração, pela primeira vez a juventude terá um lugar específico. Para aprimorar essa elaboração, representantes do Conselho Nacional de Juventude – Conjuve reuniram-se com oito ministérios e com a Secretaria Nacional de Juventude, que integra a Secretaria-Geral da Presidência da República.

“Os ministérios se mostraram abertos ao diálogo, as discussões foram acaloradas e ricas, mas o tempo exíguo para o tamanho da tarefa”, afirma Maria Virgínia de Freitas, coordenadora de Juventude da Ação Educativa e membro da Comissão de Avaliação e Acompanhamento de Políticas do Conjuve. Ela destaca a necessidade de um trabalho mais longo e aprofundado do Conselho durante a fase de elaboração dos programas e políticas. “A visão de juventude ainda é muito discrepante no governo, há ministérios que não possuem políticas pensadas para a juventude, enquanto entre os que já as possuem, não há uma concepção unificada sobre as necessidades desse segmento”, explica Maria Virgínia.

Com isso, a Comissão pretende acrescentar no Plano de Trabalho do próprio Conselho a realização de seminários entre a Secretaria Nacional de Juventude, o Conjuve e os ministérios, visando à elaboração conjunta de diretrizes para políticas. De acordo com Maria Virgínia, “a proposta diz respeito à formulação de uma compreensão compartilhada que oriente as políticas de cada ministério para a juventude”.

Secretaria Nacional

O Conjuve também discutiu com a Secretaria Nacional de Juventude/SNJ sua proposta para o PPA. “A partir da avaliação do diálogo com os ministérios, propusemos que se reforçasse o papel da SNJ na garantia de articulação com os ministérios no processo de formulação das políticas”, afirma Maria Virgínia.

Os objetivos setoriais propostos pela Secretaria Nacional de Juventude estão assim formulados: garantir a formulação e implementação, de forma articulada, da Política Nacional de Juventude; ampliar a participação da sociedade civil na formulação, implementação, avaliação e monitoramento da Política Nacional de Juventude; e, promover e executar programas específicos destinados a jovens.

Dentro desses objetivos, a Secretaria propõe, entre outras ações, a criação de um Observatório da Juventude no Governo Federal, a realização de duas edições da Conferência Nacional de Juventude, sendo a primeira em 2008, e a implementação de um programa, para jovens de 18 a 29 anos, articulando ensino fundamental com qualificação profissional no nível de formação inicial e do desenvolvimento humano.

Nas diretrizes para a Política Nacional de Juventude, publicadas pelo Conjuve em 2006, foi identificada a necessidade de se constituir um sistema público de pesquisa sobre juventude, já que entre os órgãos que tratam o tema atualmente não há uma convergência entre abordagens e metodologias. Assim, Maria Virgínia considera a criação do Observatório como uma iniciativa muito interessante. “O desafio é que ele seja construído em diálogo com os observatórios e centros de pesquisa já existentes e propicie uma ampliação e um fortalecimento da produção de dados e pesquisas nesse campo, oferecendo diagnósticos mais precisos para a elaboração das políticas públicas”, avalia.

A Conferência Nacional de Juventude é uma reivindicação de diversos movimentos juvenis e organizações que atuam neste campo e, para contribuir na sua preparação, uma comissão do Conjuve já está em atividade.

Quanto ao programa específico, os conselheiros e conselheiras manifestam diversas preocupações: alguns avaliam que a SNJ deveria concentrar seus esforços nos seus dois outros objetivos; outros questionam o fato de que esse programa específico se concentre apenas num segmento da juventude. Debate que, para Maria Virgínia, certamente, precisará ser aprofundado em outros momentos.

Publicado originalmente pela Central de Notícias do Portal Ação Educativa (http://www.acaoeducativa.org.br/base.php?t=nger_0359&y=base&x=lnger_0001&z=03)

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Saiba mais lendo as cartas que o CONJUV endereçou à Coordenação Nacional do PROJOVEM e ao Grupo Interministerial responsável por articular as políticas de juventude do Governo Federal:

a) Carta ao GT interministerial (.pdf)

b) Carta à Coordenação Nacional do PROJOVEM (.pdf)

4º Parlamento Jovem abre inscrições

A Câmara dos Deputados acaba de lançar a quarta edição do programa Parlamento Jovem, que selecionará 78 estudantes para viver, durante uma semana, a experiência de debater e votar projetos na Câmara dos Deputados, em Brasília. Podem participar alunos de 16 a 22 anos que estejam cursando o 3º ano do Ensino Médio, em qualquer um dos estados do país. Os interessados devem elaborar um projeto de lei. Inscrições terminam no dia 14 de setembro

A Câmara dos Deputados acaba de lançar a quarta edição do programa Parlamento Jovem, que selecionará 78 estudantes para viver, durante uma semana, a experiência de debater e votar projetos na Câmara dos Deputados, em Brasília. Podem participar alunos de 16 a 22 anos que estejam cursando o 3º ano do Ensino Médio. Os interessados devem elaborar um projeto de lei em uma das seguintes áreas: a) educação, cultura, esporte e turismo; b) agricultura e meio ambiente; c) economia, emprego e defesa do consumidor; d) segurança pública; e) saúde.

As inscrições vão até 14 de setembro e podem ser feitas diretamente nas secretarias estaduais de educação. As atividades dos jovens deputados em Brasília ocorrerão na última semana de novembro (19 a 23). A posse será realizada no plenário da Câmara dos Deputados, no dia 20 de novembro, às 10 horas.

Na Câmara, os jovens participarão de todas as fases do processo legislativo, como a apresentação de proposições e emendas, debates e apreciação nas comissões e votação no plenário. Serão eleitos líderes e membros de uma mesa diretora, que serão responsáveis pela condução dos trabalhos.

Os interessados poderão obter mais informações junto à direção da sua escola e das secretarias de educação de seu Estado ou do Distrito Federal, ou junto ao Consde, pelo telefone (61) 3322-8759, pelo e-mail consed@consed.org.br; ou ainda na Câmara dos Deputados, pelo telefone 0800-619619. No portal da Câmara (www.camara.gov.br) há um link que dá dicas de como elaborar um projeto de lei.

Originalmente publicado em http://www.multirio.rj.gov.br/portal/riomidia/rm_materia_conteudo.asp?idioma=1&idMenu=3&label=Mat%E9rias&v_nome_area=Mat%E9rias&v_id_conteudo=68772

Entrevista com Lio Nzumbi

O jovem baiano Lio Nzumbi, ativista do MNU – Movimento Negro Unificado, articulador da Campanha Reaja ou Será Mort@, será um dos palestrantes do ENJUNE, mediando a Roda de Discussão sobre Segurança, Vulnerabilidade e Risco Social. Em entrevista ao site do ENJUNE, Lio fala sobre a política de segurança nacional e o atual estágio da violência racial no Brasil

Quais são suas expectativas sobre a realização do ENJUNE?

Acredito que o ENJUNE é um momento ímpar onde a juventude negra vai ter a oportunidade de articular demandas frente ao poder público, além de fortalecer os elos que façam das instâncias de juventude negra, pessoas e militantes, um bloco coeso frente ao poder branco e a investida de extermínio.

Como você analisa os desdobramentos do processo de violência racial que acontece no Brasil?

Nós do Reaja ou será Mort@ estamos a algum tempo dizendo que existe um genocídio, ele não é algo por acaso, se trata de ações apoiadas pelo estado, quando não são promovidas pelo estado através da mão da polícia, elas são permitidas, toleradas, como é o caso dos grupos para-militares, os grupos de extermínio ou o estado através de uma “omissão”, com muitas aspas.

Trata-se de um processo que é sistematicamente organizado. Nestas últimas semanas diante dos fatos ocorridos no Rio de Janeiro, o caso da mulher que foi espancada por playboys por ter sido confundida com uma prostituta, assim como também a policia vêm recrudescendo as suas forças através de um novo esquadrão, que é esta da força de segurança nacional. É a força de segurança para combater o que eles chamam de crime organizado, mas o combate pressupõe a intensificação da violência racial nos bairros de periferia, como é o caso da proposta da redução da maioridade penal. 

O atual modelo de segurança pública é visto de que maneira pela juventude negra atuante no Reaja na Bahia?

Nós estamos rediscutindo novos rumos porque acreditamos que não é possível ficar olhando um governo posar de popular, de esquerda e democrata, as forças que estão alinhadas com os anseios do povo, enquanto na realidade a mesma estrutura que diz respeito à segurança pública, não somente da manutenção dos cargos de chefia da polícia, mas estou me referindo também a própria política de segurança, os bairros do subúrbio, por exemplo, estão sendo aterrorizados, foi no governo de Wagner que estamos acompanhando esse esquema lá de Maracangalha, até hoje tem gente morrendo na cidade.

No governo estadual atual estamos acompanhando também a criminalização do movimento contra a violência racial em Salvador, como a Campanha Reja ou ser Mort@. Isso é uma baixa política, o estado se movimenta também no sentido de reprimir e de enfrentar todos aqueles que ameaçam um perigo real, eu acredito que todo jovem negro de periferia é um inimigo do estado. E agora isso se mantém de uma forma mais veemente porque existe uma alusão de que estamos num governo popular, democrático, mas que, no entanto, mantém a violência racial com a mesma intensidade.

Um dos objetivos do ENJUNE é construir diretrizes de intervenção nas políticas públicas de juventude. Como você analisa este propósito?

Sim, o ENJUNE vai construir uma postura da juventude negra organizada em todos os âmbitos do poder instituídos, nacional, estadual e municipal. Isso envolve dizer para o Ministério da Justiça que a juventude negra está com os dentes trincados que não vai observar os nossos serem aniquilados e ver isso de uma forma banal. Esta conjuntura que devemos estar pleiteando em todos os âmbitos do poder instituído.

Que soluções você aponta para a emancipação da juventude negra?

A emancipação da juventude negra consiste em reunir os esforços da própria juventude negra para a superação daquelas barreiras colocadas pelo Projeto Brasil que está pautado em nosso genocídio, um Projeto Brasil que exporta mísseis, aviões a jato, mas que, no entanto, não é capaz de viabilizar oportunidades de vida digna para nossa juventude. Acreditamos que agora através do ENJUNE nós possamos congregar algumas forças da juventude negra organizada para a superação dessas barreiras que o genocídio nos impõe, a emancipação da juventude negra pressupõe além de mais um elo de articulação da África Continental e da Diáspora e da consolidação de bloco políticos que sejam autônomos economicamente, politicamente e a criação de alternativas de poder que estejam para além de partidos, ong’s, sindicatos das instâncias do poder branco que sempre nos mantiveram como reféns.  

Quais os pontos que a juventude negra tem priorizado na discussão sobre a violência?

Aqui na Bahia e em alguns pontos do Brasil, nós estamos reagindo muito aos estímulos, há algum tempo a Campanha Reaja tem colocado se as nossas comunidades e as nossas organizações comunitárias não se organizarem para fazer um enfretamento à violência racial, nós vamos estar sempre fazendo assim, reagindo a estímulos. Não é apenas necessário fazer uma análise de conjuntura ampla para saber qual é o quadro, o quadro não é diferente, é o mesmo de 500 anos atrás, só que agora vestido sob a cara de um governo popular e democrático. Agora mesmo estamos priorizando a redução da maioridade penal, com a Campanha Reaja, uma articulação nacional contra a redução racista da maioridade penal, porque os jovens que estarão sendo penalizados serão jovens negros e negras.

Assim como estamos encampando a luta contra o regime disciplina diferenciado, o regime de cárceres que estão superlotando as prisões de corpos de homens e jovens negros, como também encampamos a discussão pela descriminalização do aborto.

Entrevista retirada do BOletim do ENJUVE - Encontro Nacional de Juventude Negra
www.enjuve.com.br

O outro assalto das ruas

Metrópole de São PauloA apropriação privada do espaço público; “Vivem em lugares protegidos e querem impor, pela prepotência e pela força, uma lógica privada no espaço que é público”. A afirmação é de José Guilherme Cantor Magnani, professor do departamento de Ciências Sociais da USP, procurando explicar a agressão a doméstica Sirlei Dias de Carvalho

Como antropólogo e há décadas estudando a dinâmica das cidades, evita generalizações ao máximo, mas insiste que a construção do urbano ainda é uma experiência fascinante de ser vivida e compartilhada. Autor de vários títulos, prepara-se para lançar pela editora Terceiro Nome o livro Jovens na Metrópole. Contém dez estudos etnográficos feitos entre rappers, skatistas, adeptos do hip-hop, pichadores e outras denominações juvenis.

Diante das manifestações de violência mais comentadas na semana, pergunto: a vida humana vem perdendo valor na metrópole?

Não sou especialista em violência. Mas, vendo uma mulher sozinha num ponto de ônibus, de madrugada, apanhar de cinco rapazes desconhecidos, ou ao ser informado da morte de um casal num farol de São Paulo, ou ainda me deparando com duas dezenas de mortes, fruto da ação policial num morro carioca, é muito tentador cair nas generalizações. No entanto, seria simplificar tratar questões tão diversas utilizando a mesma chave da violência. O que se pode fazer é uma reflexão em torno da “rua” como elemento que estrutura o espaço público.

Como assim?

Meus alunos e eu trabalhamos com a cidade na escala da metrópole. Ou seja, a metrópole é portadora de uma dinâmica tal que não pode ser explicada como totalidade. Nem em São Paulo, nem no Rio, nem em qualquer outra grande cidade brasileira, podemos olhar os jovens apenas como uma faixa etária, porque eles são diferentes, fazem escolhas diferentes, criam pontos de encontros particulares nos quais se reconhecem, compartilhando estilos e valores. Não estão confinados, ao contrário, percorrem a cidade em deslocamentos constantes e percursos próprios. Onde é que a rua entra nisso? Ela representa a possibilidade do encontro entre os diferentes. Nela, o indivíduo não tem informação sobre as origens e a história do “outro”, mas existe uma norma estabelecida para o reconhecimento mútuo.

Essa é a idéia de rua como espaço de negociação?

É isso. Muita gente só vive a experiência da rua física, a rua como espaço de rolagem, de passagem de pedestres e automóveis. Por outro lado, há quem faça do shopping center a sua rua. Na estação Conceição do metrô de São Paulo, meus alunos pesquisaram um fenômeno interessantíssimo: jovens descendentes de japoneses fazem street dance, dividindo espaço com jovens negros de periferia, que dançam break. Ali se encontram, se olham, se estranham e trocam experiências. Na Barra Funda, um bairro paulistano de classe média baixa, verificamos o jeito que as crianças dos cortiços inventaram para ir, em relativa segurança, rumo a um decaído centro desportivo da região, onde fazem atividades: elas vão em bando, com uma educadora, cantando alto e chamando a atenção das pessoas, porque perceberam que assim a travessia é mais segura. Elas negociaram com a metrópole.

Que tipo de experimentação da rua faz um grupo de rapazes de bom nível sócioeconômico, que costuma perseguir prostitutas?

Isso é o que eu chamo de apropriação privada do espaço público. Esses rapazes impõem pela força seus valores. São os donos da rua. Não querem compartilhar o espaço, que é público, com prostitutas ou mendigos. Demonstram um perfil complicado, de quem não admite o diferente, seja pela atividade que este exerça, pela raça, pela orientação sexual, assim por diante. Ferem uma característica essencial da rua como espaço de troca. Porque isso é viver em metrópole. Não se pode admitir que grupo algum impeça, ainda mais pela violência, as pessoas de utilizar o espaço público.

Esse tipo de comportamento reflete uma visão de classe?

Certamente. Mas o que estou ressaltando é a perspectiva individualista que nega ao outro o direito à cidade. Estes rapazes se valem de uma lógica particular, individualizada, que tem a ver com o meio em que foram criados. Só que a casa é um espaço privado, protegido por lei, enquanto a rua é de todos. Por isso trabalho muito com a noção de “pedaço”, algo intermediário entre a “casa” e a “rua”. Pedaço é a apropriação social do espaço. “Aqui é o meu pedaço”, você diz para justificar este sentir-se em casa sem excluir ninguém. Fizemos um trabalho de campo nas Grandes Galerias, ao lado do Teatro Municipal, no centro de São Paulo. Ali você encontra material para grafiteiro, skatista, profissionais que fazem trancinhas para visual black, há gente que vai só para comprar disco, enfim, cada nicho do edifício é um “pedaço” no qual os jovens provam essa sensação de pertencimento. Na periferia, esse processo existe e está associado à vizinhança.

Seria uma confluência de tribos urbanas?

Não gosto de utilizar o conceito de “tribo” quando analiso as metrópoles, porque trata-se de uma metáfora equivocada. Na etnologia indígena, tribo é a representação de uma grande aliança, ao passo que nos estudos de metrópole, o conceito tem sido usado de modo restritivo. Tribo vira algo menor, sinônimo de grupo fragmentado, com freqüência relacionado à violência. Sempre é melhor falar em circuitos de jovens - e como é interessante analisar os mapas de sua movimentação! Mas, veja o que acontece nos Estados Unidos, o país mais rico do mundo: jovens bem nutridos, bem educados e com alto padrão de vida também formam grupos autoritários, muitas vezes com repercussões dramáticas. Basta lembrar as chacinas em escolas. De tão fechados, viram fundamentalistas Até o momento não podemos compará-los a um grupo de hip-hop de uma grande cidade do Brasil, que é bem mais flexível. Agora, que existe radicalismo na metrópole, não há como negar. É o preço que se paga de viver em um ambiente de alta diversidade.

Existe uma tendência geral de privatização do espaço público?

Não sei se é tendência. O pichador se apropria do espaço público? Depende. Um aluno meu já estudou esse fenômeno e diz que “pichador nem a mãe gosta”. Claro, quem vai gostar de alguém que se diverte riscando parede? Mas não me parece que o pichador queira apropriar-se do espaço público, mas deixar uma marca nele. Uma inscrição que nem sempre entendemos, significando algo como “estive aqui”.

Não é uma análise complacente demais?

Tenho de levar em conta todos os atores envolvidos. Se quero entender a lógica do grafiteiro, terei de entender a lógica do proprietário do imóvel. Considero tudo, o sentimento do dono do muro, a atuação do poder público, o pichador, as instituições envolvidas etc. O olhar etnográfico procura identificar todos os atores. Sem tomar partido. E acabamos por demonstrar que as coisas são um pouco mais complexas do que as aparências indicam.

Voltando ao caso da Sirlei. O que se pode dizer de uma metrópole onde uns querem deixar sua marca e outros são marcados?

Esta moça é a parte frágil da relação. Sendo elemento mais fraco, deveria contar com maior amparo do poder público. Ela deve ter o direito de esperar pelo transporte público, sozinha, independente de que hora for, num local melhor equipado e policiado. Uma vez que a agressão já aconteceu, deve ter ampla possibilidade de defesa, porque os rapazes, até pelo poder econômico dos pais, terão condições de contratar bons advogados. Quer dizer, Sirlei poderá continuar sozinha nessa história e seus agressores, bem amparados. Esta é a diferença. Então, o que se espera do poder público? Que seja capaz de, em situações assimétricas, criar o equilíbrio. Numa sociedade democrática, o mais fraco tem de ser o mais amparado.

Em cidades como São Paulo, Rio ou Brasília, o jovem da classe média ou alta circula numa seqüência de espaços protegidos: a casa, a escola, o clube, o shopping center, o carro com vidros escuros, o saguão com câmeras, e assim por diante. Mas, ao sair pela madrugada e encontrar a cidade “nua”, parece bater uma vontade de assaltar o espaço público. Como se explica isso?

Para impor sua lógica, repito. Não há outra explicação. Só que o freqüentador do oásis de segurança perde de vista que a rua é pública, já tão acostumado que está a interagir com os iguais. A “geração shopping center” circula de espaço protegido em espaço protegido de tal forma que não sabe como se comportar no espaço público. Não tem nem postura corporal para isso. É uma geração sem cultura urbana. Ora, se você é uma estudante universitária, bem informada, mas não aceita a vida de uma prostituta, ao menos a respeite e comporte-se no espaço público. É o mínimo. O que justifica queimar uma pessoa que dorme num banco de praça, como fizeram com um índio em Brasília? A rigor, é mais coerente pensar que nós deveríamos nos sentir mais protegidos no espaço público, que, afinal, é de todos. E não o contrário.

O senhor aplicaria esta afirmação às favelas do Complexo do Alemão, no Rio, onde se trava uma guerra urbana há 50 dias?

Nos morros, os traficantes também constituíram seus “oásis” protegidos, na medida em que circulam por espaços nos quais o poder público não entra ou não se faz presente. São donos absolutos do pedaço.

Ações de vandalismo, violência e apropriação indevida da cidade são muitas vezes praticadas no chamado “tempo livre” de jovens. É impressão ou o lazer, nas metrópoles, virou vizinho da delinqüência?

Creio que não. Tenho estudado há um bom tempo o lazer, seja na periferia, seja no centro, com jovens ou não. Como a gente sabe, o tempo livre tende a continuar aumentando na sociedade contemporânea, deslocado que está da noção de trabalho. Até um tempo atrás, ele era a antítese de trabalho. Não é mais. Tornou-se um fim em si mesmo. Daí tanta gente cultivando a forma física, buscando suportes para a alma, viajando e estabelecendo novos vínculos. Não vivemos mais aquele tempo ditado por uma regra básica da produção industrial, segundo a qual o indivíduo tem direito ao descanso justamente para repor energias físicas e psíquicas, antes de voltar a ser consumido como força de trabalho. Hoje, com a terceirização, a possibilidade de trabalhar à distância e as ocupações temporárias, o tempo livre aumenta. Devemos encará-lo como espaço para o desenvolvimento de novas sociabilidades, e isso, numa cidade como São Paulo, é uma experiência fascinante. Na verdade, o fato de a metrópole funcionar como funciona, com suas possibilidades e deficiências, é maravilhoso. É o grande milagre. O que destoa é a investida autoritária de um e outro grupo.

As pessoas criam seus arranjos, a metrópole funciona, mas a violência faz surtir o efeito de má exemplaridade. Tanto que ela se reproduz no cotidiano, das mais diferentes formas, em qualquer hora do dia, em qualquer ponto da cidade.

Precisamos sair da análise do espaço público para avaliar as instituições do poder público. Onde estão? Como agem? Falo não só das instituições voltadas para a segurança, mas as da educação, saúde, e tantas outras. Episódios de violência seriam exemplares, sim, se houvesse respostas firmes e rápidas contra eles. Isso não existe. Além disso, há outro problema grave. Estamos vendo um sem-número de mazelas das classes dirigentes, que nos passa essa terrível sensação de impunidade permeando a sociedade. Isso tem reflexos na vida da metrópole. Se para “eles” tudo é possível, por que eu tenho de pagar impostos e cumprir minhas obrigações como cidadão? Quando um policial é pego num episódio de corrupção, justo ele que deveria contê-la, causa uma tremenda confusão lógica na cabeça do cidadão: ele não só se sente desamparado, como à mercê de um ator social do qual não conhece a verdadeira face.

Esta é uma pergunta que muitos pais se fazem: mais tempo livre, mais tempo para transgredir?

Não penso assim. Se tenho tempo livre, posso ler um livro, não preciso sair por aí barbarizando. A deliquência não é alternativa. Ela é resultado de uma complexa gama de fatores. E, aproveitar o tempo livre não é privilégio de quem tem dinheiro. Na periferia, há propostas de lazer muito interessantes e até baratas. Como o skatismo.

A ação da polícia no Rio, na semana que passou, além do saldo de mortos, mostra como o cidadão está vulnerável. Mata-se primeiro, depois verifica-se se é traficante ou não. Parece que todo mundo é criminoso, todo mundo mente, todo mundo tem droga.

É a lógica de metonímia, tomar a parte pelo todo. Há um grupo protegido, que são os traficantes, e o ônus de suas conexões criminosas é distribuído para a população local, gente que trabalha, que obedece normas.

E qual é a visão que se tem de poder público nas periferias?

É reconhecido como poder de repressão, mais do que como poder de mediação. O Estado se faz presente nesses lugares na figura do policial, que surge lá como a última instância do poder público, quando tudo mais falha. Quando um policial dá carona a uma gestante que está para dar à luz, vira herói, sai no noticiário, é algo fora de série. Porque é a derradeira face do poder público naquele lugar! Na verdade, não se deveria poupar investimento na sua formação. Melhorar nossas forças policiais não significa obrigatoriamente comprar mais armas e viaturas. Significa dar qualificação, informação, salário melhor, condição de trabalho. Como é importante um policial aprender o que é diversidade, saber como deve lidar com a mulher, a criança, o pobre, o negro, o homossexual, o idoso, ter, enfim, uma idéia de polidez.

O senhor propôs aos seus alunos na USP fazer a etnografia da ocupação da reitoria. Quais são as primeiras conclusões?

Cedo para dizer, ainda estamos trabalhando sobre os dados. Propus aos calouros das Ciências Sociais, que mal chegavam à universidade e caíram nessa confusão, que fizessem um trabalho levando em conta o lugar da ocupação, os personagens e a mudança de regras. No começo, foram vistos com certa desconfiança pelo comando da greve. Mas, convenceram. Não sei o que virá. E nem quero influenciar os resultados. Antropologia é isso.

*Publicado originalmente no jornal O Estado de S.Paulo, 01-07-3007.

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